Bolsa sob Judice #IBOVESPA



Até meu filho, que está a centenas de quilômetros do mercado financeiro, veio me afirmar que a IA é uma bolha. Imaginem, então, os milhares de analistas que veem suas projeções de preços ficarem obsoletas dia após dia. Tenho a propensão de acreditar que não estamos diante de uma bolha, mas prefiro sempre sustentar essa visão com lógica — é arriscado demais enfrentar o consenso sem fundamento. Hoje, porém, decidi correr o risco: não estamos em uma bolha. O movimento que vemos é racional, ainda que um pouco exagerado, mas longe de ser ilógico.

O artigo da Bloomberg, publicado esta semana, vai exatamente nessa direção. Nele, o veterano gestor William Clough argumenta que os temores de uma nova bolha tecnológica são infundados. Segundo ele, as empresas que lideram o avanço da inteligência artificial — Nvidia, Microsoft, Alphabet, Apple e outras — não lembram em nada as “ponto com” dos anos 2000: são companhias altamente rentáveis, com caixa robusto, baixa dívida e margens de lucro recordes. Clough lembra que o múltiplo médio do setor de tecnologia hoje está em torno de 25 vezes os lucros projetados, bem abaixo dos 60 registrados na euforia de 1999. Ou seja, a valorização recente está ancorada em lucros reais, e não em promessas. Em suas palavras, “há euforia, sim, mas desta vez há fundamentos que a sustentam”.

O principal motivo que leva tantos a enxergarem uma bolha é a observação rasa: o índice subiu muito, logo deve estar caro. Mas o raciocínio é simplista demais. Um dos gráficos mais citados — e mal interpretados — é o da concentração das dez maiores empresas no S&P 500, que chegou a 40% do total. Quando esse número bateu 30%, o coro dos “alarmistas” soou alto: “é hora de vender tecnologia”. Pois bem, quem seguiu essa recomendação se arrepende. As ações continuaram subindo, e o índice ficou ainda mais concentrado. O erro foi olhar apenas o preço, sem perceber que os lucros dessas empresas estão crescendo em ritmo acelerado. Faz todo o sentido que elas valham mais. É o conceito da “Carteirinha” em plena prática.


Ed Yardeni foi direto em seu relatório mais recente: o avanço do S&P 500 neste ano se deve ao crescimento dos lucros, não à expansão dos múltiplos. O índice subiu 16,2% até novembro, enquanto o P/L médio aumentou apenas 2,7%. Em outras palavras, o mercado está precificando resultados, não sonhos. Yardeni projeta o S&P em 7 000 pontos até o fim do ano e 7 700 em 2026, com 50% de probabilidade no cenário base. E mais: ele acredita que a revolução tecnológica, impulsionada por inteligência artificial e robótica, é a chave para resolver o problema estrutural de produtividade da economia — e não um fator de risco especulativo.



A comparação com o ano 2000 é inevitável. Mas o contexto é completamente diferente. Na bolha das “ponto com”, muitas empresas não tinham lucro, tampouco um modelo de negócio claro. O dinheiro fácil, a euforia e a ignorância sobre o que era tecnologia criaram uma distorção monumental. Hoje, as gigantes que lideram o movimento — Nvidia, Microsoft, Apple, Alphabet, Meta — geram lucros astronômicos e reinvestem em inovação real, infraestrutura e chips. Não é um delírio, é uma transformação estrutural.

Para reforçar esse ponto, vale observar o S&P 500 Quality Index, que mede o desempenho das empresas mais “sólidas” do índice, com base em três pilares: alto retorno sobre o patrimônio (ROE), baixa alavancagem e lucros consistentes. Ele reúne cerca de 100 ações com fundamentos robustos, reequilibradas semestralmente. Suas dez maiores participações somam cerca de 40% do total e incluem: Apple (6,2%), Mastercard (4,7%), Costco (4,6%), Visa (4,6%), Procter & Gamble (4,6%), GE Aerospace (4,5%), Coca-Cola (3,1%), Salesforce (2,6%), GE Vernova (2,5%) e Adobe (2,5%). Essas empresas são o núcleo da “alta qualidade” do mercado americano — aquelas que atravessam crises sem precisar de explicações mirabolantes.

Na bolha dos anos 2000, o índice de qualidade saiu do mínimo para o máximo num intervalo curtíssimo, refletindo a fuga do capital das empresas especulativas para aquelas com fundamentos sólidos. Já agora, ocorre o oposto: o S&P 500 Quality Index está no piso, sinal de que as ações mais consistentes têm ficado para trás — um fenômeno típico de momentos em que a euforia se concentra em poucos nomes de crescimento. Na maior parte da história recente, o índice de qualidade costuma se manter acima do S&P 500, mostrando que, no longo prazo, os fundamentos prevalecem.

O que o gráfico abaixo — “Desempenho do S&P 500 Quality Index versus S&P 500” — indica é que esse ciclo tende a se inverter. Mais cedo ou mais tarde, essa carteira deverá voltar a ter uma performance superior ao índice, provavelmente porque a composição do índice será ajustada nos próximos meses para refletir a nova realidade das empresas que geram lucros.


E aqui está a grande diferença em relação aos anos 2000: lá, as empresas “ponto com” sequer se qualificavam para o índice, pois lucro era apenas um desejo distante. Hoje, gigantes como Nvidia, Google e Microsoft não apenas geram resultados expressivos, como moldam o novo eixo de rentabilidade global. A situação passada não se repete agora. Estamos diante de uma revolução digital, uma troca de cadeiras gigantesca, em que o lucro se concentra em quem inova — e não em quem apenas promete.

Isso não significa que as demais empresas ficarão para trás para sempre. Elas ainda podem se adaptar, e quando isso ocorrer haverá um reequilíbrio natural: lucros diminuindo nas big techs e crescendo em novas participantes que conquistarem sua “Carteirinha”. Até lá, é provável que o mercado continue premiando os vencedores de hoje — não por irracionalidade, mas por mérito.

Portanto, não estamos em uma bolha. Estamos diante de uma mudança de paradigma. A inteligência artificial não é espuma de mercado, é o combustível da próxima década. O mercado pode até estar julgando o futuro, mas o veredito final ainda não foi dado — e, como o Mosca insiste em lembrar, as bolhas só existem quando o ar é quente demais para sustentar a realidade.

Análise Técnica


No post “bitcoin-sem-argumentos” escrevi o seguinte sobre o IBOVESPA: “A bolsa vem subindo diariamente, sem descanso. Essa configuração se assemelha mais a uma onda 3 do que a uma onda 5, o que coloca minha contagem em observação. Por ora, vou mantê-la.”



Percebo nas redes uma perplexidade generalizada diante da performance do índice. Muitos se perguntam como a bolsa pode subir tanto com um governo gastador e pouco reformista. À primeira vista, parece ilógico — mas, como na bolsa americana, não é porque subiu e atingiu novas máximas que está caro.

Talvez o ponto mais importante seja que o movimento da bolsa brasileira não é isolado. Ele ocorre em várias bolsas emergentes; o México, por exemplo, mostra desempenho semelhante. Claro que isso, por si só, não explica tudo — há forças que ainda desconhecemos.


— Hahaha… virou fundamentalista?

Não mesmo! Venho apontando sinais de esgotamento há algum tempo, mas isso não vem se confirmando. Como escrevi no post citado, esse movimento recente se assemelha mais a uma onda 3.
Quando situações como essa ocorrem, vale revisitar os gráficos de longo prazo para ver se não se “comeu bola”. O gráfico a seguir, em janela trimestral, cobre 25 anos e mostra que o padrão mais provável continua sendo uma grande correção do tipo A – B – C. Essa é a razão pela qual insisto: a bolsa brasileira não tem um movimento direcional. Por que não considerar, em vez de A, B, C, uma sequência 1, 2, 3, indicando o início de uma onda 3? A explicação está adiante.


Observando a onda C azul, é improvável que se trate de uma onda 3. No retângulo verde, há três períodos de movimentos direcionais (retângulos azuis pontilhados), mas a queda da pandemia violou uma das regras clássicas da teoria de Elliott — a de que a onda 3 não pode ultrapassar o limite da onda 2. Mantive a hipótese apenas como exercício técnico.

Entre 2021 e 2024, duas elipses vermelhas destacam movimentos corretivos, seguidos, mais adiante, de uma alta (novo retângulo pontilhado em azul).


Pelo critério atual, a bolsa teria um objetivo em 156.876 pontos (em azul, à esquerda do gráfico) ou, numa projeção alternativa, 164.658 pontos. Caso ultrapasse essa faixa, o alvo seguinte seria em torno de 206 mil pontos (não visível no gráfico).

Numa janela menor (diária), a falta de ferramentas limita minha análise. Ainda assim, observo um objetivo inicial em 167 mil pontos. Não incluo o gráfico aqui para não sobrecarregar o leitor.

Resumindo: antevejo o IBOVESPA subindo até 164 – 167 mil no curto prazo. Porém, continuo a ver o movimento dentro de uma macro correção, e não como um novo ciclo direcional de longo prazo.

O S&P 500 fechou a 6.850, sem variação; o USDBRL a R$ 5,2945, com alta de 0,43%; o EURUSD a € 1,1586, sem variação; e o ouro a U$ 4.193, com alta de 1,61%

Fique ligado!

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