Intenções escusas #IBOVESPA

 


Empresas com caixa ocioso e pouca criatividade estratégica estão encontrando nas criptomoedas um novo passatempo. Algumas seguem o exemplo da MicroStrategy e compram bitcoins com recursos que deveriam ser destinados ao crescimento sustentável do negócio. Outras, numa manobra ainda mais ousada, convertem seus ativos digitais em títulos do Tesouro americano para obter a chancela de “Stable Coin”. A primeira opção é uma clara aberração de governança; a segunda, uma distorção travestida de sofisticação financeira.

O tema ganhou força nos últimos dias com a divulgação de que a Tether – maior stablecoin do mundo – atingiu a impressionante marca de US$ 98,5 bilhões em títulos do Tesouro dos EUA, figurando entre os maiores detentores estrangeiros da dívida americana. Vale lembrar que, em 2020, essa cifra era próxima de zero. A guinada é tão marcante que levou o Congresso americano a redigir o projeto de lei batizado de GENIUS (Guiding and Establishing National Innovation for US Stablecoins), cujo objetivo é criar um ecossistema regulado para essas moedas até agosto. A proposta foi barrada na última votação, mas a expectativa é que avance ainda este ano.

A Tether, cujo valor de mercado ultrapassou US$ 150 bilhões em maio, atua essencialmente como um fundo de mercado monetário disfarçado de criptoativo. Suas reservas lastreadas em ativos do Tesouro funcionam, na prática, como um canal informal de financiamento da dívida americana. Mais de 99% do valor de mercado das stablecoins está atrelado ao dólar, e os emissores desses tokens detêm mais de US$ 120 bilhões em reservas em moeda americana. Isso explica por que o governo dos EUA tem interesse em acelerar sua regulamentação: trata-se de uma forma de fortalecer a demanda por dólares num momento em que a hegemonia cambial está sendo desafiada por outros polos geopolíticos.

Segue abaixo gráfico do Deutsche Bank mostrando o crescimento das reservas da Tether em Treasuries:



No entanto, há uma contradição fundamental nesse processo. Se por um lado a adoção de stablecoins pode representar uma alavanca para a supremacia do dólar na infraestrutura digital global, por outro, a ausência de regulamentação transforma o setor em um campo fértil para práticas duvidosas. O artigo da Bloomberg é incisivo ao apontar as semelhanças entre a situação atual da Tether e o colapso da Wirecard, a empresa alemã que falsificou mais de US$ 2 bilhões em seus balanços e implodiu o mercado de fintechs na Europa. A Alemanha, inclusive, é hoje o epicentro das preocupações regulatórias quanto à transparência das reservas dessas moedas.

A matéria do Wall Street Journal reforça o alerta. O artigo destaca que a maior derrotada com o endurecimento das regras propostas no GENIUS Act seria justamente a Tether. Entre os pontos mais críticos estão a falta de auditorias regulares, a não divulgação detalhada da composição dos ativos e a utilização de instrumentos financeiros opacos. Essa opacidade é o que permite aos emissores misturar “outros ativos” em suas carteiras sem qualquer restrição, como bem observado pelo Mosca.

Se um investidor quiser se expor a títulos do governo americano, há centenas de fundos regulados e auditados que oferecem essa opção de maneira segura, com menor risco operacional e cibernético. O apelo das stablecoins está mais associado ao marketing do que à lógica financeira. E quando uma empresa opta por esse tipo de investimento, ela se afasta de sua missão produtiva e se aproxima perigosamente da especulação. Como acionista, isso me faz questionar seriamente a competência da gestão.

Apesar disso, há exceções. Ontem comentei aqui no Mosca o caso da corretora Robinhood (HOOD), que conseguiu aplicar o conceito de Blockchain de forma genuinamente útil: permitir que clientes europeus invistam em ações americanas sem pagar corretagem. Nesse caso, o uso da tecnologia cripto não tem viés especulativo, mas sim funcional, o que deveria ser a essência do movimento digital financeiro.

As stablecoins não desaparecerão. O que está em jogo é como serão inseridas no sistema financeiro tradicional. Se seguirem crescendo sem regulação, teremos novas versões da FTX e da Wirecard. Mas se forem trazidas para dentro do guarda-chuva das normas já existentes – com auditoria, segregação de ativos e clareza jurídica –, podem sim se tornar instrumentos legítimos de liquidez e transação.

Resta saber se o Congresso americano terá coragem para enfrentar os interesses que orbitam essas moedas digitais. A Tether, por exemplo, já movimenta cifras que a colocam em rota de colisão direta com grandes fundos globais e até com bancos centrais. Não é por acaso que há resistências ao avanço do GENIUS Act. Quando o dinheiro encontra brechas na legislação, o lobby se encarrega do resto.

O Mosca continuará acompanhando esse tema de perto, com a cautela de quem já viu muitos “milagres tecnológicos” desmoronarem quando confrontados com a realidade da governança e da transparência. A diferença entre inovação e ilusão costuma estar na regulação – e no bom senso.


Análise Técnica

No post “voltando-vaca-fria”, comentei sobre o IBOVESPA: “A sobrevivência dessa contagem está baseada na possibilidade de um triângulo traçado em laranja. O que não pode acontecer é a violação do nível de 133.945; caso isso ocorra, coloca em risco uma queda para níveis pelo menos abaixo de 120 mil.”




Como já havia comentado, estou utilizando um novo provedor de dados que não contempla as informações da bolsa brasileira. Ainda mantenho o sistema antigo, que já está pago até o início do próximo ano — depois verei se continuo com ele. Sinceramente, estava decidido a não publicar mais gráficos e sugestões desse ativo, pois constatei o quão arcaico é o MetaStock em comparação ao MotiveWave, que utilizo há alguns anos.

Se não fosse pelo valor elevado que cobro pelos meus serviços, teria abandonado, mesmo sabendo que boa parte dos leitores acompanha o IBOVESPA. Resolvi tentar por mais um tempo. No entanto, as sugestões deverão ser reduzidas, pois, como poderão observar no gráfico a seguir, não disponho do mesmo nível de ferramentais.

– Xiiii David, chega de desculpas e vamos ao que você pode oferecer.




No post mencionado, abordei a possibilidade da formação de um triângulo — e parece que é exatamente isso que está se formando. Se estiver certo, espere uma correção ao redor de 136 mil, seguida por uma alta até o nível de 150 mil. Mas o triângulo pode falhar, e essa mini queda não deveria ultrapassar os 133.945 pontos, como já mencionado. Sugiro comprar no rompimento do nível de 140 mil.

O S&P 500 fechou a 6.227 (ATH) com alta de 0,47%; o USDBRL a R$ 5,4250, com queda de 0,62%; o EURUSD a € 1,1797, sem alteração; e o ouro a 3.358, com alta de 0,60%.

Fique ligado!

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