Desconfiança é o risco #S&P 500
Ultimamente, vem sendo comentada uma ideia lançada por
Stephen Miran É um plano ambicioso para enfraquecer o dólar, por meio de
tarifas, acordos e manobras multilaterais, visando impulsionar as exportações
americanas, reduzir o déficit e aliviar a pressão sobre a dívida pública.
Reestruturando a Dívida Americana: Um Jogo de Estratégia
e Equilíbrio
Os Estados Unidos estão em uma encruzilhada econômica,
carregando uma dívida pública que ultrapassa 120% do PIB e um sistema
financeiro global que, embora os eleve ao topo, cobra um preço alto. Em *A
User's Guide to Restructuring the Global Trading System*, Stephen Miran,
estrategista da Hudson Bay Capital, oferece uma análise lúcida e um conjunto de
ideias que desafiam as regras do jogo. A dívida americana não é apenas um
fardo; pode ser uma alavanca. Com um dólar supervalorizado e o papel de
provedor de segurança e liquidez mundial, os EUA têm a chance de reescrever as
regras, redistribuir custos e fortalecer sua posição. O plano é ambicioso, mas
factível – e exige mais estratégia do que bravata.
O Dólar como Ativo e Passivo
O dólar reina porque o mundo o demanda como reserva. Esse
privilégio, porém, tem um custo. Miran resgata o dilema de Triffin: para suprir
ativos de reserva globais, os EUA precisam tolerar déficits persistentes. Desde
1982, com raras exceções, o saldo em conta corrente americano é negativo – um
reflexo de como o dólar forte favorece importações baratas, mas pressiona a
indústria local. Enquanto o PIB global cresce mais rápido que o americano, o
fardo de financiar essa liquidez mundial aumenta, alimentando a dívida
pública.
Hoje, com déficits fiscais anuais próximos de 7% do PIB e o
Social Security Trust Fund projetado para se esgotar em 2033, a
sustentabilidade da dívida está em debate. Mas Miran não vê um beco sem saída;
ele enxerga uma oportunidade. Reestruturar esse endividamento, redistribuindo o
ônus entre parceiros globais, pode ser a chave para equilibrar as contas e
revitalizar a economia americana.
A participação dos EUA no PIB global caiu desde os anos 1960, mas estabilizou recentemente, sugerindo espaço para ajustes estratégicos na gestão da dívida.
Tarifas: Receita com Inteligência
Miran destaca as tarifas como um primeiro passo prático.
Trump já demonstrou seu potencial em 2018-2019, quando elevou as tarifas sobre
a China em 17,9 pontos percentuais, arrecadou bilhões e viu o renminbi
desvalorizar 13,7%, suavizando o impacto inflacionário nos EUA. A lição?
Ajustes cambiais podem transferir o custo para os exportadores estrangeiros,
enquanto o Tesouro americano enche os cofres. Com propostas atuais de tarifas
de 60% sobre a China e 10% ou mais sobre outros países, a receita pode chegar a
US$ 5 trilhões em dez anos – o suficiente para estender os cortes de impostos
da era Trump sem pressionar ainda mais a dívida.
Esse fluxo de caixa é um pilar essencial da reestruturação.
Diferente de impostos sobre renda, que distorcem a economia, tarifas bem
calibradas – Miran sugere um "ótimo" de 20% – podem até gerar ganhos
ao reduzir preços de importação. A ideia é elegante: taxar o exterior para
aliviar o contribuinte interno, usando os recursos para estabilizar o
refinanciamento da dívida. Retaliações são um risco, mas os EUA, com seu
mercado consumidor e peso financeiro, têm vantagem para negociar em posição de
vantagem.
Dólar Ajustado, Dívida Aliviada: A Via Multilateral
Tarifas preparam o caminho, mas Miran vai além, propondo
ajustes no valor do dólar via acordos multilaterais. Aqui surge o conceito de
um "Acordo de Mar-a-Lago”: parceiros comerciais, pressionados por tarifas
ou pela necessidade de manter o guarda-chuva de segurança americano, poderiam
valorizar suas moedas e comprar Treasuries de longo prazo – talvez até
"century bonds". Isso traria duplo benefício: um dólar mais
competitivo impulsionaria as exportações americanas, enquanto a extensão do
vencimento da dívida reduziria a pressão de rolagem em um cenário de juros
altos.
Déficits em conta corrente desde 1982 refletem o impacto do dólar forte – um ajuste multilateral poderia trazer equilíbrio ao comércio e à dívida.
Pense no seguinte: China, com US$ 3 trilhões em reservas, e outros players asiáticos e do Oriente Médio detêm a maior fatia dos dólares globais. Convencê-los a trocar papéis curtos por bonds de longo prazo daria ao Tesouro americano mais fôlego, transferindo parte do risco de juros para o exterior. O precedente do Plaza Accord de 1985, que enfraqueceu o dólar com sucesso, mostra que isso é viável. A diferença agora é o tamanho da dívida – três vezes maior em relação ao PIB –, o que torna a execução ainda mais estratégica.
Unilateralismo com Precisão
Se a cooperação multilateral emperrar, Miran sugere opções
unilaterais criativas. Uma delas é usar o International Emergency Economic
Powers Act (IEEPA) para cobrar uma taxa sobre os juros pagos a detentores
estrangeiros de Treasuries – um "pedágio" pelo uso de ativos
americanos. Iniciando em 1% e subindo gradualmente, isso desestimularia a
acumulação de reservas, enfraqueceria o dólar e geraria receita extra. Outra
possibilidade é vender ouro do Tesouro ou usar o Exchange Stabilization Fund para
comprar moedas estrangeiras, valorizando-as em relação ao dólar.
Essas propostas desafiam a visão tradicional de que o dólar
só dança ao som do Fed. Miran argumenta que o Tesouro, com apoio histórico do
Fed em políticas cambiais (como na Operation Twist dos anos 1960), tem
ferramentas para agir sozinho. O risco de volatilidade nos mercados existe –
yields podem subir se estrangeiros venderem Treasuries –, mas uma abordagem
gradual e coordenada pode minimizar turbulências.
Uma Estratégia em Camadas
Reestruturar a dívida americana exige um plano em etapas.
Miran prevê tarifas como ponto de partida, gerando receita e alavancagem
negocial. Em seguida, ajustes cambiais – multilaterais ou unilaterais –
reequilibrariam o comércio e dariam sustentabilidade à dívida. Políticas
paralelas, como desregulamentação e energia acessível, bandeiras de Trump,
ajudariam a conter a inflação, facilitando o processo. O objetivo? Um EUA que
divide melhor o custo de ser o "banco do mundo", fortalecendo sua economia
sem sacrificar o domínio global.
A dívida chinesa, acima de 350% do PIB, é um ponto de pressão que os EUA podem usar para negociar acordos favoráveis à reestruturação.
Conclusão: Equilíbrio com Visão
Miran não quer criar pânico; ele está desenhando um mapa. A
dívida americana é um desafio, mas também uma oportunidade para os EUA
redefinirem sua posição no sistema global. Tarifas, acordos multilaterais e
manobras unilaterais formam uma caixa de ferramentas para redistribuir o peso
do dólar e da segurança mundial. No Mosca, já discutimos como o domínio do
dólar é um ativo em constante teste. Miran nos mostra que, com visão e execução
precisa, os EUA podem mantê-lo – e prosperar. Trump vai jogar esse xadrez?
Minha experiência profissional, em que presenciei inúmeras
tentativas de “modelos” para o câmbio, mostra que eles não funcionaram. Por
exemplo, aqui no Brasil tivemos a “diagonal endógena” implantada por Gustavo
Franco, cujo objetivo era permitir uma depreciação controlada do real.
Funcionou até que pressões externas forçaram, no final, a adoção do câmbio
flutuante. Nesse período, antes de Armínio Fraga assumir o BC, Chico Lopes,
presidente interino, resolveu adotar uma banda cambial ampliada de R$ 1,32 – me
lembro desse dia em que a taxa subiu de uma vez de R$ 1,20 para esse limite. Em
dois dias, perdemos US$ 40 bilhões de reservas, levando o real a R$ 1,60.
Essa é apenas uma das passagens que vivi, e posso concluir
que tentar mexer no câmbio de forma estrutural – modelagem, banda,
conversibilidade e qualquer outra – não funciona. O melhor modelo é deixar
flutuar e só intervir pontualmente por algum motivo específico, e não tentar
“defender”. Essa é minha primeira crítica a essa ideia.
A outra – troca compulsória de papéis do governo de curto
prazo para de longo prazo (eternidade) –, é ainda mais audaciosa, mesmo que
seja para um grupo específico, que no caso seriam os governos. Vamos entender
que ninguém espera que a dívida pública de um país seja liquidada, e sim
rolada. No vencimento, o Estado entrega o dinheiro, o investidor recebe e
imediatamente quer comprar um outro título. Somente um caso de desconfiança da
moeda, por algum motivo, pode criar uma corrida de venda e não renovação. Agora,
se você “convida” um grupo a trocar seu título por outro muito pior em termos
de taxa e vencimento, os outros irão imediatamente pensar que seriam os
próximos. O governo pode jurar por tudo que é sagrado que não vai fazer, mas o
investidor, na dúvida, vai querer cair fora. A desconfiança é o grande
risco.
Felizmente, como comenta o Deutsche Bank, “Stephen Miran,
novo presidente do CEA – Council of Economic Advisers, órgão que tem a função
de fornecer análises econômicas e aconselhamentos ao presidente, disse em
entrevista à Bloomberg que seu documento de novembro, base do ‘Acordo de Mar-a-Lago’,
é apenas um ‘livro de receitas’, com Trump como ‘chef’ focado em tarifas,
sugerindo que um realinhamento cambial é improvável no curto prazo, embora
riscos de políticas não convencionais para reordenar o comércio e finanças
globais sigam no radar”. Espero!
Análise Técnica
No post “O Fed vai apertar o botão de pausa”, fiz os
seguintes comentários sobre o S&P 500: “em uma janela de 1 hora, pode-se
argumentar que há um padrão de cinco ondas menores, mas isso, por si só, não é
definitivo. Em termos de níveis, destaquei duas regiões: o retângulo vermelho
indica um ponto até onde o índice pode chegar e voltar a cair – ou seja,
precisa superar essa região para confirmar uma mudança; já o retângulo verde
pode oferecer suporte para novas altas”.
Tudo parece seguir conforme o estabelecido no post acima. A
bolsa já ultrapassou o primeiro limite de 5.743 e agora caminha rumo ao patamar
de ~ 5.800; aí será um bom teste. Se ultrapassar, vou ficar cautelosamente mais
otimista, mesmo assim esperaria – e notaria o shape da alta – entrar na região
entre 5.900 / 6.000.
- Xiiii David, ficou mais covarde? Agindo dessa forma,
vai perder uma boa alta.
Se realmente a última queda foi um ponto de reversão, existe
10,5% entre a mínima e a máxima. Não estou desprezando esse número, ele é
importante, mas qualquer ação minha nesse intervalo, por enquanto, é mais
torcida que técnico. O Mosca não está aqui para adivinhar movimentos e sim
entender o que o mercado diz.
O S&P500 fechou a 5.776, com alta de 0,16%; o USDBRL a
R$ 5,7096, com queda de 0,95%; o EURUSD a € 1,0792, sem variação; e o ouro a U$
3.019, com alta de 0,23%.
Fique ligado!
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