Manual de emergência


Existe uma situação na vida de um investidor que pode se tornar muito destrutiva em relação a perda de capital. É comum que no decorrer de seus investimentos que você se sinta compelido a apostar contra a tendência em curso. Isso pode acontecer ou porque você vendeu a posição muito cedo ou pior, queria comprar mas ficou na dúvida e viu o mercado subir na sua cara.

Nessa situação, você se sente como tivesse “vendido” uma sensação de perda a cada alta, sem que ela exista. Mas, de repente, o mercado passa por uma pequena queda e parece que tudo ficou mais claro. “Sabia que ia cair”. E, inesperadamente, o mercado volta a subir novamente e, caso tenha se aventurado na venda, o sangramento é real.

Nesses últimos tempos, tenho encontrado vários leitores que me perguntam se não seria a hora de vender o SP500. Minha análise técnica aponta esse mercado como o mais firme de todos, nenhuma indicação de queda ainda. Sugiro terem calma, pois quando, e se o mercado cair, teremos tempo para entrar no trade de venda. Contudo, sinto que minhas palavras são levadas com ceticismo, pois a sensação deles é que a queda será abrupta. Mas um mercado firme como esse não despenca de uma vez.

Um analista de nome Charles Hugh Smith publicou um gráfico que explica como um crash acontece na maioria das vezes. Sua ideia não é baseada em análise técnica, mas na psicologia em que uma reversão se dá.


Quando existem muitos relatórios que indicam que o mercado está perigoso, e muitas sugestões para se apostar na alta da volatilidade, o mercado sobe ao invés de cair.

Por que? Esse cenário negativo cria o clássico Wall of Hurry - A tendência periódica dos mercados financeiros de superar uma série de fatores negativos e manter a ascensão. O muro de preocupação geralmente é usado em conexão com os mercados de ações, referindo-se à sua resiliência quando se depara com um tropeço temporário, ao invés de um impedimento permanente para um avanço no mercado. A compra de U$ 300 bilhões de ativos por parte dos bancos centrais por mês ajuda a impulsionar essa alta ascendente. Os que apostam na baixa, baseado em fundamentos, são atropelados por esse avanço continuo.

A medida que os bancos centrais anunciam sobre o fim de suas políticas monetárias extraordinárias, aumentando um pouco as taxas de juros (para que eles possam diminuir quando a próxima recessão chegar), os especuladores, percebendo que as apostas em juros e volatilidades mais baixas diminuem, iniciam operações de venda.

Subitamente, um vácuo no mercado origina uma queda iniciada por algumas novidades. Mas a mentalidade reinante até aquele momento é de comprar sempre que bolsa retrai, “buy on dips”. Isso faz com que o mercado recupere rapidamente.

No entanto, as dúvidas permanecem e os dados fundamentais ainda são fracos; esse excesso de negatividade reconstrói a parede da preocupação. Alguns traders acreditam que o mercado está enfraquecido e que a queda é eminente. Acreditando que não vai conseguir ultrapassar a máxima anterior – double top.

Mas, teimosamente, o mercado ultrapassa aquela máxima atingindo novos recordes, limpando o bolso desses últimos especuladores. Os outros traders ficarão hesitantes em vender e os investidores que apostam na alta ficarão mais confiantes, mesmo com dados econômicos negativos.

Esse novo momento infunde os participantes com complacência e um senso que o mercado passou pelo pior que poderia acontecer. Tudo parece apontar para novas altas até o mercado cair surpreendendo a todos.

Bem, mas quando isso vai acontecer? Ninguém sabe. O importante é que não pode haver uma multidão de analista prevendo uma queda. Não pode haver uma quantidade de posições vendidas na bolsa e elevadas apostas na alta da volatilidade. Todo mundo que aposta tudo numa queda e na alta da volatilidade precisa ser destruído antes do mercado cair.

O acidente tem que pegar quase todos desprevenidos.

Depois dessa queda mais acentuada, um novo grupo, acreditando na continuidade e aproveitando-se, entram comprando novamente. Porém, contrariamente à expectativa, um movimento de venda começa a se materializar; desta vez são os investidores que usam essa recuperação para saírem definitivamente de suas posições.

Os bancos centrais são vistos como sendo poderosos, e os últimos 8 anos apoiam a crença convencional de que um novo anúncio de política monetária sempre reverterá qualquer desaceleração. Os anúncios dos bancos centrais provocam pequenos movimentos de alta, mas só para algumas horas.

O mercado percebe que as coisas mudaram, os bancos centrais não podem reverter a onda de medo, e pequenas altas são encaradas agora como oportunidades de venda.

Essa descrição parece um pouco complicada para quem não está acostumado com o linguajar do mercado. Vou procurar resumir os principais pontos: em primeiro lugar, o que esse analista chama a atenção é o que o mercado estará preparado para cair quando não existir mais “nenhuma” aposta na venda, todos que tentaram, foram stopados; depois, ficar atento para uma queda do mercado mais ampla, o que eu enfatizei em verde; em seguida, deve-se preparar para a venda.

Um analista técnico que usa a teoria de Elliot Waves tem como analisar se a queda destacada em verde é um potencial candidato em identificar a máxima, e se o mercado vai entrar num movimento de queda. Acontecendo isso, deve-se preparar para vender na próxima alta e, seguramente, será inferior ao máximo atingido.

Esse é o manual de emergência que estou seguindo no acompanhamento do SP500 e, por enquanto, nenhum sinal que a alta terminou. Quem está comprado, mantenha seu stoploss curto, e quem não está, tire umas férias, não invente de vender agora, mesmo que estejamos na iminência de virar. Talvez você acertasse no bumbum da mosca, e se isso acontecer, seria por pura sorte, pois o mais provável é que você perca dinheiro.

Amanhã vou comentar sobre um estudo realizado pelo banco Goldman Sachs sobre os fatores que poderiam indicar uma recessão nos EUA. Isso não substitui as ideias acima, pois não necessariamente é preciso que haja uma recessão para a bolsa cair.

Como a assunto do dia é bolsa vou comentar sobre o SP500. No post tarde-demais-para-poupar, fiz os seguintes comentários sobre o SP500: ...” ultimamente o mercado ficou contido entre as duas linhas verdes traçadas no gráfico acima. Pode ser que começou uma mini queda até a parte inferior, que corresponde a aproximadamente 2.380. A linha cinza enfatiza que o mercado está “cansado”... O gráfico a seguir já contempla os últimos dias, e a bolsa continua ainda na parte superior.

 
Se o mercado estava “cansado” antes, está mais cansado agora. Em algum momento acredito que uma retração a pelo menos 2.380 é possível.

- David, vamos ver se eu aprendi a lição de hoje: esperamos essa queda, em seguida uma nova alta e nesse movimento vendemos até as calças. Vamos pegar um peixe grande!
Recomendo reler o post acima. Quem disser que essa queda do nível atual até 2.380, já identifica o que eu frisei acima - depois ficar atento para uma queda do mercado mais extensa – negativo!

Fique tranquilo, vamos ter todo tempo do mundo para apostar na baixa, pois como já mencionei em post anteriores, a queda deverá perdurar por um bom tempo.

O SP500 fechou a 2.419, com queda de 0,81%; o USDBRL a R$ 3,3138, com alta de 0,54%; o EURUSD a € 1,1340, com alta de 1,45%; o ouro a U$ 1.246, com alta de 0,24%.

Fique ligado!

Comentários

  1. Verdade, quase pior que: comprar, bater no stoploss e seguir para 200%, 300% de alta! Teve muita gente na crise das ponto.com que foi contra o mercado e perderam uma nota. Qual seria a solução? Tenho um amigo que trabalhou no Prop Desk do Goldman Sachs de Londres, ele me comentou que pratica o hedge emocional? Ele aloca 3%-4% da carteira no mercado em ebulição: "Let the markets have its fun". Se a posicão triplicar, o investimento tem 12-15% da carteira. Se perder, perdeu 3-4% do capital! Claro que trabalha com um stoploss bem ajustado a cada tipo de situação!

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  2. Cada um tem que escolher a melhor forma de encarar o risco, que varia de pessoa para pessoa. No meu entender, a sugestão de seu amigo é a que eu prefiro. Pouco valor envolvido em ativos de elevado potencial de ganho.

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  3. Muito boa a crítica!

    Caro Sr. David, uma idéia para uma próximo post: o efeito do credit impulse no Mundo. Como a China revertendo o mega impulso, os PMIs do mundo podem começar a cair com um lag, os PMIs do mundo já não estão perfeitamente correlacionados como nos últimos 6 meses. É incrível ver o importantes leading indicators (Citi US Macro Surprise, Earnings Expectations, Yield Curve, Bloomberg Commodities Index) imbicando para baixo e o S&P 500 e outras bolsas subindo sem parar. No entanto, o Gráfico consolidado do Balance Sheet dos principais bancos centrais é impressionante, parece que só eles que sustentam os mercados!

    Realmente, este parece ser o Pain Trade: apostar contra o mercado, enquanto mais participantes compram momentum de alta e estimulam o investimento passivo!

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