"Back to business" #USDBRL


O mundo acordou com um misto de alívio e incredulidade. Após meses de tensão comercial e retórica inflamada, Estados Unidos e China anunciaram um acordo parcial: Pequim voltará a exportar terras-raras e Washington, em contrapartida, suspenderá a tarifa de 100% sobre determinados produtos estratégicos. Parece pouco, mas é o suficiente para provocar um rally nas bolsas e reanimar investidores que já começavam a desconfiar da consistência da alta recente.


Mas o mais interessante não é o acordo em si, e sim o que ele revela. Donald Trump, novamente protagonista, mostrou que continua a reger o mercado global como quem move as peças de um xadrez político. A trégua comercial foi cuidadosamente coreografada para coincidir com o anúncio da vitória de Javier Milei nas eleições legislativas argentinas — um alinhamento que não é mera coincidência.

A revolução de Milei

Enquanto o mundo observava a diplomacia sino-americana, a Argentina deu um salto histórico. Javier Milei consolidou sua maioria relativa no Congresso, ampliando a presença do partido La Libertad Avanza para mais de um terço das cadeiras. O feito não apenas garante poder de veto às suas reformas como representa a consagração de um experimento de mercado radical que, há pouco tempo, parecia condenado ao fracasso.

A austeridade de Milei — cortes severos de gastos, desvalorização abrupta do peso, demissões em massa e o fim dos subsídios — começa a mostrar resultados: inflação em queda para 32% (vinda de 200%) e o primeiro superávit primário em mais de uma década. O custo social é alto, mas a confiança dos investidores voltou. O apoio explícito de Trump, acompanhado de um pacote de US$ 20 bilhões em linhas de crédito, reforça o caráter simbiótico dessa aliança.

Milei aposta todas as fichas em um choque liberal profundo, convencido de que só um corte radical pode salvar um país exaurido por décadas de populismo. Sua agenda — ousada, imprevisível e de altíssimo risco — tem dividido economistas e despertado atenção internacional. Pela primeira vez em muito tempo, a Argentina volta a ser observada não pela crise, mas pela tentativa de romper o ciclo de decadência que a aprisiona.

A diplomacia das tarifas e o enigma chinês

O acordo entre Washington e Pequim é uma trégua, não uma solução. Conforme destacou a Bloomberg, os negociadores limitaram-se a colher os “frutos baixos do pomar”: exportação de terras-raras, importação de soja e redução de tarifas pontuais. Ficaram de fora os temas realmente explosivos — subsídios estatais, competição tecnológica e segurança nacional.

Trump obteve vitórias táticas, garantindo o reabastecimento de insumos cruciais para a indústria americana e algum fôlego para sua agenda eleitoral. Xi Jinping, por sua vez, ganhou tempo para reforçar sua política de autossuficiência industrial até 2030. Ninguém cedeu em pontos estratégicos.


A história ensina que tréguas comerciais quase nunca significam paz duradoura. Em 1985, o Acordo do Plaza redesenhou o câmbio global e preparou o terreno para a bolha japonesa. Hoje, o risco é semelhante: um dólar ainda forte, uma China mais introspectiva e um comércio mundial reorganizado por razões políticas, não econômicas.

Trump e Lula: encontros de conveniência

No meio desse tabuleiro, houve espaço até para gestos diplomáticos inusitados. O encontro entre Trump e Lula, noticiado com euforia pela imprensa brasileira, mal mereceu menção nas páginas internacionais. Para Washington, foi um evento lateral, quase folclórico; para Brasília, uma tentativa de mostrar protagonismo.

Do ponto de vista prático, nada de relevante foi decidido. O principal item que interessava aos EUA — o fornecimento de terras-raras — já havia sido resolvido diretamente com Pequim. Resta, portanto, o simbolismo: um ex-presidente americano em plena campanha global, e um líder latino-americano buscando visibilidade em meio à estagnação doméstica. Ambos exploraram a foto, mas nenhum saiu fortalecido.

Essa assimetria é reveladora. Enquanto Trump negocia com Xi e influencia Milei, Lula tenta garantir espaço num tabuleiro que se move rápido demais para o ritmo da diplomacia brasileira.

O Fed e o delicado equilíbrio

Enquanto o mundo digere o noticiário geopolítico, o foco volta-se novamente ao Federal Reserve. Os dados de inflação de setembro confirmam a desaceleração, mas não o controle definitivo do problema. O núcleo do índice de preços subiu 0,2% no mês, abaixo do esperado, sustentado por uma inesperada trégua no custo da moradia.

Jonathan Levin lembra que a inflação de bens básicos ainda está 1,5% acima do ano anterior e que tarifas recentes sobre importados voltaram a pressionar o setor industrial. Para completar, o mercado de trabalho segue resiliente. Ou seja, o Fed pode até cortar os juros agora, mas dificilmente sustentará uma trajetória agressiva de afrouxamento monetário sem novas evidências.

John Authers reforça a mesma dúvida: se o Fed decidir reduzir os juros esta semana, estará sinalizando que aceitou um novo patamar-alvo de 3% para a inflação. A questão é política e simbólica. Depois de dois anos de aperto, o banco central parece disposto a tolerar uma inflação mais alta — um ponto de inflexão perigoso para quem ainda acredita em estabilidade de preços como âncora de confiança.


Entre a bolha e o fundamento

No pré-market, os índices acionários renovam máximas históricas. Os que insistem em ver bolha estão perplexos: o mercado sobe amparado por lucros recordes e expectativas de crescimento ainda robustas. “Estamos numa bolha?”, perguntei a mim mesmo várias vezes nas últimas semanas. Não sei — e talvez ninguém saiba. O que é certo é que o preço das ações continua sustentado por fundamentos, ainda que o otimismo se aproxime do exagero.


A inteligência artificial continua sendo o vetor da narrativa. A Amazon anunciou que automatizará 75% de suas operações, dispensando meio milhão de empregados. É o avanço da eficiência com o custo social da obsolescência. Os ganhos de produtividade são inegáveis, mas as consequências humanas ainda estão por ser medidas.

Reflexão final

Vivemos um momento de inflexão: a política voltou a dominar a economia. Trump negocia tarifas como quem distribui cartas num cassino global; Xi Jinping redefine o papel do Estado; Milei experimenta um liberalismo de choque em um país traumatizado; Lula tenta manter relevância no palco internacional; e o Fed, hesitante, tenta preservar a confiança sem perder o controle.

A boa notícia é que o mundo voltou a funcionar — back to business. A má notícia é que talvez estejamos entrando em uma nova era em que a previsibilidade, esse bem tão precioso para investidores e governos, torna-se novamente escassa. E quando a previsibilidade se esvai, o mercado passa a viver de fé — uma fé curiosa, que alterna entre a esperança e o pânico, sempre com um olho nas telas e outro nas planilhas.


Análise Técnica

No post “ A riqueza traz angústia” fiz os seguintes comentários sobre o dólar: “O limite imposto na parte inferior está se aproximando, o que pode indicar que a alta recente era uma onda b dentro de uma correção mais complexa. Com a violação observada hoje pela manhã, refiz a estrutura da correção em andamento. Segundo essa nova hipótese, a área onde pode ocorrer a reversão situa-se dentro do retângulo destacado entre R$ 5,09 e R$ 4,95 — o que, se confirmado, implica em mais 6% de queda”


O mercado ficou indefinido na última semana sem ganhar movimento nem para cima nem para baixo. Relendo o texto acima talvez tenha passado a impressão que estou trabalhando com a opção de queda, quero enfatizar que estou agnóstico no momento, se colocarem um revólver na minha cabeça como se diz na gíria seria forçado a optar pela queda, mas só nesta situação.

Ficamos de espectador esperando o mercado nos dizer para onde quer caminhar, isso não deve demorar muito. O intervalo entre R$ 5,55 e R$ 5,27 é de aproximadamente 5%, se meu amigo quiser fazer alguma coisa é problema dele!


O S&P 500 fechou a 6.875, com alta de 1,23%; o USDBRL a R$ 5,3728, com queda de 0,34%; o EURUSD a € 1,1645, com alta de 0,16%; e o ouro a U$ 3.996, com queda de 2,85%.

Fique ligado!

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