Ondas de dúvida #IBOVESPA
O processamento do nosso cérebro é uma máquina
fascinante. Absorvemos milhares de informações por dia — e, mesmo quando
acreditamos que elas se dissipam, continuam ali, no inconsciente, especialmente
quando desafiam nossas convicções. Hoje, acordei com uma dúvida persistente: e
se a inteligência artificial não gerar o aumento de produtividade esperado? E
pior — e se ela nem sequer se pagar?
Se essa hipótese for verdadeira, estamos diante
de uma bolha monumental, talvez comparável às maiores da história. Não basta
apontar que a Nvidia tem lucros estratosféricos; afinal, seu sucesso depende
diretamente da demanda dos chamados “hyperscalers”, empresas que sustentam o
ecossistema de IA com investimentos bilionários em chips e data centers. Se a
rentabilidade prometida não vier, o castelo pode ruir.
O paradoxo da
utilização
Dois relatórios recentes do Deutsche Bank foram o gatilho dessa dúvida. O
primeiro mostrou que os Estados Unidos, epicentro da revolução da IA, não
lideram o uso prático dessas ferramentas. Apenas 26% dos americanos as
utilizam, contra 59% nos Emirados Árabes e em Singapura. É um dado
desconcertante. Produzir tecnologia de ponta é uma coisa; integrá-la
efetivamente à rotina produtiva é outra bem diferente.
O segundo relatório revelou que os gastos
europeus com o ChatGPT estagnaram desde maio, após um crescimento explosivo em
2023. A comparação com plataformas maduras como Spotify e Netflix é reveladora:
ambas têm centenas de milhões de assinantes pagantes, enquanto a OpenAI segue
com números expressivos de usuários ativos, mas poucos dispostos a abrir a
carteira.
A ilusão do
crescimento automático
A questão vai além do ChatGPT. No artigo “AI’s Effect on the US Economy Is
Exaggerated”, Ernie Tedeschi, da Bloomberg, desmonta a tese de que a IA está
impulsionando fortemente o PIB americano. Embora os investimentos tenham
crescido 40% desde 2021, boa parte desse capital corresponde a importações de
equipamentos e software, o que significa que o impacto líquido sobre o PIB
doméstico é bem menor do que se alardeia.
Ao descontar as importações, a contribuição da
IA para o crescimento americano cai de 1,3 para apenas 0,5 ponto percentual —
um número modesto diante da euforia dos mercados. O autor alerta ainda que o
efeito sobre o emprego é desigual: enquanto alguns setores se beneficiam,
outros enfrentam desaceleração, sem evidências claras de uma revolução de
produtividade.
O risco do “meh”
tecnológico
Outra visão interessante vem do economista Daron Acemoglu, prêmio Nobel, que
alerta para um perigo mais banal do que as distopias de ficção científica: o da
automação medíocre. Segundo ele, o verdadeiro risco não está em máquinas
superinteligentes, mas em tecnologias apenas razoáveis — capazes de eliminar
empregos sem aumentar a eficiência.
Ele chama isso de “automação mais ou menos”:
sistemas que prometem milagres, mas entregam apenas redução de custos imediata
e impactos sociais profundos. O exemplo clássico é o dos caixas automáticos. As
redes varejistas cortaram centenas de milhares de empregos, mas as margens não
melhoraram. A tecnologia avançou, mas a produtividade real permaneceu
estagnada.
A lição dos que
estudam o crescimento
Joel Mokyr, outro laureado com o Nobel, lembra que crescimento econômico exige
tempo, cultura e abertura ao risco. O motor da Revolução Industrial levou mais
de um século para aparecer nas estatísticas. As invenções cruciais — como a
máquina a vapor — só produziram ganhos quando integradas a novas formas de
organização do trabalho e pensamento.
Mokyr insiste que prosperidade não é resultado
de planejamento central, mas de curiosidade, experimentação e tolerância ao
erro. É o oposto do que se vê hoje: governos e empresas injetando trilhões em
uma corrida onde poucos questionam o retorno real.
A maratona chinesa
Enquanto isso, a China vive sua própria corrida pela supremacia tecnológica. O
artigo “China’s AI Dragons Must Survive ‘Involution’ to Conquer the World”
descreve um mercado hipercompetitivo, onde milhares de startups disputam
margens mínimas.
O país optou por abrir o código de seus modelos
para acelerar o progresso e contornar as restrições americanas, mas isso criou
um efeito colateral: a monetização desapareceu. Com produtos gratuitos e
guerras de preços, empresas sobrevivem de capital estatal e promessas de longo
prazo. O governo incentiva, mas Xi Jinping já alertou contra o risco de
“competição desordenada”.
Reflexão final
O ChatGPT não foi feito para nossa comodidade de saber quantas calorias tem
determinado alimento, fazer a análise das possíveis causas de uma dor que sente
ou montar um roteiro de suas férias. É muito útil, mas para isso não se paga.
Talvez amanhã eu pense
diferente — novas informações podem mudar tudo. Mas o que me deixa apreensivo é
que a aposta em IA virou um jogo de tudo ou nada. Não há plano B. Se a promessa
de produtividade não se concretizar, a maior bolha do século XXI pode estar se
formando diante de nossos olhos, impulsionada por fé tecnológica e liquidez
barata.
A história mostra que o progresso é possível, mas exige tempo, realismo e uma cultura de experimentação — não apenas hype. O Mosca prefere observar as ondas com cautela: algumas são de progresso, outras apenas de espuma. E, por enquanto, o mar da inteligência artificial parece mais agitado do que profundo.
Análise Técnica
No post “onde-está-o-desinvestimento” fiz os
seguintes comentários sobre o IBOVESPA: “Sempre que cinco ondas terminam se
inicia a dúvida de qual grau será a correção.” “Vamos iniciar com a que seria
de menor grau. Nesse caso, está destacado no gráfico abaixo os parâmetros. A
retração deveria atingir no máximo entre 141,8 mil (já atingiu) – 139,3 mil. O
que não pode acontecer é superar 138,4 mil, o que levaria para o segundo caso.”
Minha perspectiva para a bolsa brasileira é de queda nas próximas semanas. A principal razão é a formação de cinco ondas destacadas no retângulo em verde. Mas antes disso ocorrer, uma retração pode surgir, tendo os seguintes limites: 142,7 mil / 143,6 mil / 144,5 mil. A queda deveria levar até a casa dos 135 mil pontos (a ser mais bem definida no futuro). Os níveis apontados no post acima perdem relevância pelo fato de já ter sido completado o movimento de cinco ondas mencionado.
— “David, a bolsa está caindo por culpa sua, de tanto colocar uruca!”
Desculpa, meu amigo. Você decidiu entrar por
conta própria, e eu não fico secando a bolsa — apenas expresso o que os
gráficos me dizem. Estou te dando as dicas de como sair desse embrulho.
Vou mais além: primeiro, não sei se essa
correção que menciono acima vai ocorrer (acho que sim) e qual será sua extensão
(posso ter mais dicas nos próximos dias). O que quero enfatizar é que, depois
de terminado esse movimento — lá pelos 135 mil, como mencionei — a bolsa poderá
subir daí em diante, desde que enxerguemos cinco ondas. Caso contrário...
O S&P 500 fechou a 6.671, com alta de 0,40%;
o USDBRL a R$ 5,4648, com queda de 0,38%; o EURUSD a € 1,1645, com alta de
0,33%; e o ouro a U$ 4.211, com alta de 1,67%.
Fique ligado!
Acho que pouco a pouco os investidores vão se convencendo da irracionalidade do mercado atual. A narrativa da IA é incrível, principalmente devido aos sólidos resultados da Nvidia, pois ela tem resistido até a guerra comercial que é o principal efeito Macro do ano. Claro que ainda tem chance de subir, principalmente com ações do FED de queda de juros e aumento de liquidez. Não vou nem entrar no caso da do marketing barato do Altman, da OpenIA, e no financiamento circular que está ficando cada vez mais evidente. Porém, acho que a primeira falha na Nvidia ou Open IA, pode causar uma onda de vendas, principalmente se isso vier com quedas no emprego americano.
ResponderExcluirsugiro que leia o post de hoje onde comento um relatório da Goldman que contrapõe a ideia que o que se gasta em IA é absurdo, eles acham dentro dos parâmetros históricos
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