A China surpreende (sempre!)
Recentemente compartilhei um artigo que colocava uma sombra
de dúvida em relação à economia chinesa — o terrorista econômico —, mas talvez
a realidade seja um pouco diferente quando observamos os detalhes, como relata
Anjani Triveldi na Bloomberg.
A China industrial está viva e bem, apesar das preocupações
de uma desaceleração econômica. Só não parece igual ao que era antes — ou pelo
menos, ao que todos estão acostumados.
Os dados da semana passada mostraram um quadro sombrio: a
produção industrial subiu 3,8% em relação ao ano anterior, abaixo das
expectativas, o investimento fixo cresceu mais lentamente do que o previsto e o
crédito, geralmente um sinal de que a economia está avançando, foi fraco. Os
números do setor imobiliário, há muito tomados como uma indicação de que as
autoridades iriam sustentar a farra da construção alimentada pela dívida dos incorporadores,
estavam deprimentes em geral. O Goldman Sachs Group Inc. cortou
sua previsão de produto interno bruto para a economia da China, reduzindo
sua projeção para este ano de 3,3% para 3%.
Outros números, porém, pintam um quadro diferente: as áreas
prioritárias de Pequim estão indo muito bem. As instalações de baterias de
veículos elétricos da China aumentaram 114%, enquanto a produção e as vendas de
EV cresceram mais de 100% em julho. Os prazos gerais de entrega dos
fornecedores estão atualmente bem acima do nível médio desde janeiro de 2020,
mas para as indústrias emergentes que incluem fabricação de
equipamentos high-end, os EVs e outros setores aumentaram acentuadamente nos
últimos meses. Além disso, apesar do que as pesquisas de sentimento dizem, o investimento estrangeiro direto na manufatura high-tech da
China aumentou 31,1% nos primeiros seis meses do ano. O investimento
sul-coreano subiu 37,2%, enquanto os EUA subiram 26,1%.
Supor que toda a economia esteja indo ladeira abaixo é
engano. A verdade é que as prioridades industriais de Pequim no desenvolvimento
de setores de alta tecnologia não mudaram muito das estabelecidas nos últimos
planos quinquenais. Nesta semana, os ministérios da ciência e tecnologia e
finanças apresentaram um plano para 2022 e 2023 para medidas que incluem apoio
financeiro e incentivos fiscais para aumentar as capacidades técnicas das
empresas e a capacidade de inovar — onshore e offshore.
Investidores e observadores da China não queriam acreditar
que o chão de fábrica do mundo poderia se atualizar seletivamente e ganhar a
parte de mercado como tem feito. Não me entendam mal — isso não é uma avaliação
otimista sobre o súbito peso tecnológico da China. Trata-se mais de dar uma
olhada mais profunda na mudança da anatomia da economia industrial do país. As
expectativas baseadas no que a China Inc. costumava ser, portanto, não servem.
O país já está subindo na escada de valor. A tecnologia de
baterias EV e toda a cadeia de suprimentos ao seu redor, incluindo o processamento
de metais, estão em casa na China. Empresas em setores prioritários continuam a
aumentar seus gastos de capital.
A Longi Green Energy Technology Co., fabricante de
materiais de painéis solares com capitalização de mercado de quase US$ 70
bilhões, anunciou na semana passada que estava gastando um adicional de 6,95
bilhões de yuans (US$ 1,02 bilhão), além dos 19,5 bilhões de yuans já
anunciados, para aumentar a capacidade de um projeto de produção de células
solares e módulos em Ordos, na Mongólia Interior. A BYD, apoiada pela Berkshire
Hathaway de Warren Buffett, assinou um acordo para investir 28,5 bilhões de
yuans em um plano de produção de baterias. A Chipmaker Semiconductor
Manufacturing International Corp. disse que não estava planejando cortar seus
planos de gastos de US$ 5 bilhões, seu maior investimento em comparação com o
valor gasto anualmente nos últimos cinco anos. As despesas no setor de energia
renovável — representando pouco mais de 80% da nova capacidade no primeiro
semestre deste ano — aumentaram 22,4% no segundo trimestre.
As maiores empresas de tecnologia industrial do mundo
reconhecem o quanto precisam da China também. Empresas como a fabricante
holandesa de equipamentos de chips de alta tecnologia ASML Holding NV reconheceram
isso. Em se último relatório em julho, o diretor executivo da empresa, Peter
Wennink, disse: "Precisamos perceber que a China é um importante player na
indústria de semicondutores" com a capacidade de fabricação de certos
tipos de fabricação de chips que "o mundo precisa". Ainda assim, a
ASML foi pega pela geopolítica, com os EUA pressionando os Países Baixos a proibir
a empresa de vender para a China.
Não há dúvida de que há más notícias, mas se você olhar as
manchetes passadas sobre os confinamentos seguidos, empresas problemáticas em
setores não prioritários e racionamento de energia, é claro que a intenção de
Pequim de avançar permanece sólida. Então, embora algumas empresas em Sichuan tenham que equilibrar
o uso de eletricidade e os volumes de produção, outros lá disseram que suas
operações não serão afetadas. De fato, uma visão otimista é que, à medida que a
China constrói um chão de fábrica melhorado, o país poderia eventualmente
aliviar as pressões de desemprego, especialmente para a crescente massa de graduados
universitários sem emprego.
A memória do mercado é curta, mas é importante recordar os
problemas da China — o setor imobiliário em ruínas, bancos pequenos instáveis e
exuberantes mercados monetários de curto prazo — estão
em gestação faz tempo. Tudo isso não deve ser uma surpresa, então. Hora de
olhar através de uma nova lente.
Esse artigo me remete à teoria do economista Joseph Schumpeter
sobre o conceito de destruição criativa: um processo de destruição e posterior
reconstrução, com outro arranjo dentro da sociedade, que leva ao progresso
econômico.
Este fenômeno ocorre quando empreendedores criam novos
produtos ou novas formas de produzir, causando mudanças na economia. Ao longo
dos tempos, há inúmeros exemplos desse fenômeno, da substituição das velas e
tochas por lâmpadas elétricas até a recente substituição dos telefones fixos
pelos celulares.
Além desses exemplos mais óbvios, existem outros mais
estruturais, onde um setor é eliminado para a criação de outro mais moderno — e
pode ser que a China esteja evoluindo dentro dessa mudança. É sabido que o
setor imobiliário tem grande peso sobre o PIB chinês, respondendo por 1/4 de
seu PIB.
Enquanto a China crescia a 10% a.a. e migrava de uma
economia agrícola para uma industrial, era premente a construção de moradias
para a migração que ocorreu do campo para as cidades. Nessas condições, fazia
sentido uma parcela relevante do setor imobiliário. Porém, esse crescimento
deve estar se esgotando, não sendo mais necessária a construção de tantas casas.
Se meu raciocínio é valido, algo que parecia ilógico pode
não ser tão ilógico assim. Durante os últimos meses, em um relatório que
acompanho a oscilação de papéis nos mercados emergentes, as empresas de
construção dominaram as quedas com níveis substanciais. Não era incomum notar títulos
que caíram 30%/40% no dia, e eu estou falando de renda fixa!
Essa movimentação me deixava preocupado, pois tinha receio
que contaminaria o resto da economia e ficava perplexo por não ver uma intervenção
do governo. Sem agir diretamente em nenhuma companhia, tomou medidas na área
macroeconômica, com a liberação de empréstimos e a queda nos juros.
Mas se o intuito do governo foi de deixar ocorrer a
“destruição criativa” e focar na área de high tech, não poderia ser diferente,
algumas teriam que quebrar para forçar uma diminuição na participação do PIB.
Não vamos saber se foi intencional ou por acaso; se foi
intencional, mais uma vez a China surpreende no campo econômico.
No post comprar-ou-vender, fiz os seguintes comentários sobre a nasdaq100: ... “Nada feito ainda, o índice da bolsa, quando observado numa janela menor, parece estar no final do último estágio da alta mais recente; nestas condições só nos resta esperar, além do mais será muito instrutivo, e mais adiante vou explicar o porquê no cenário alternativo. O gráfico a seguir apresenta o que espero na entrada da compra” ...
Eu fico abismado com a quantidade de relatórios e estudos tentando descobrir como a bolsa irá se comportar daqui em diante através de comparação com dados passados. Se o viés do analista é de alta, escolhe o que mais combina com sua ideia e, ao contrário, se é de queda faz o inverso – no post de ontem fiz comentários sobre essa forçada de barra. Bem, então veja o gráfico a seguir comparando a evolução do SP500 agora com a crise de 2009.
Os mercados terminam a semana mostrando que o céu não é o limite e correções ocorrem. Nos próximos 30 dias eu calculo teremos a definição mais clara se a mínima do ano ficou para traz ou ainda será testada.
Fique ligado
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