Descolar do passado #Ibovespa
Quem conhece a técnica de meditação sabe a importância de se
desvincular tanto do passado como do futuro e focar exclusivamente no presente.
Eu fiz um curso há poucos anos e constatei a eficiência desse método; toda vez
que me encontro de certa forma “perturbado”, tiro alguns minutos para meditar,
ao terminar é como se eu limpasse minha memória, podendo raciocinar menos
envolvido com as experiências passadas ou temores futuros.
Um artigo publicado por Frederik Gieschen no site Neckar´s
mind of the market contempla várias experiências de investidores
proeminentes, enfatizando que o mercado não tem memória — então por que
deveríamos ter?
De acordo com a teoria do mercado eficiente, o mercado não
tem memória (embora talvez tenha alguma na forma do fator de momentum?).
As pessoas, por outro lado, tendem a se lembrar de suas vitórias e derrotas
vividamente. Elas fazem registros, colecionam troféus e acumulam cicatrizes.
Mas suas lembranças podem rapidamente se tornar obstáculos.
No livro The Money Game, escrito durante o mercado de
alta dos anos 60, um gerente de portfólio apelidado de “O Grande Winfield”
mostra orgulhosamente ao autor sua equipe de jovens analistas que ele chama de
seus “filhos”.
"Meu jovem", disse O Grande Winfield ao telefone.
“Nosso problema é que estamos velhos demais para esse mercado. Os melhores
players desse tipo de mercado ainda não passaram dos 29 anos. Venha aqui e eu
lhe mostrarei minha solução.”
“Este é um mercado de jovens”, explica ele. Os jovens
estavam dispostos a comprar empresas de leasing de computadores porque a
necessidade de computadores era “praticamente infinita” e os lucros aumentariam
“cem por cento este ano, dobrariam no ano que vem e novamente no ano seguinte.
A alta mal começou.”
Ao contrário do autor, os analistas não estavam sendo contidos
pelas más lembranças de mercados de baixa do passado.
“Olhem para o ceticismo no rosto desse velho safado”, disse O
Grande Winfield, apontando para mim. “Olhem para ele, formulando perguntas
sobre depreciação, sobre a rapidez com que esses computadores são depreciados.
Eu sei o que ele vai perguntar. Ele vai perguntar o que faz uma empresa
financeira valer cinquenta vezes os ganhos. Certo?"
“Você não pode ganhar dinheiro com perguntas como essa”,
disse O Grande Winfield. “Elas mostram que você é de meia-idade, mostram sua
geração. Mostre-me um portfólio, eu lhe direi a geração.”
“Olhem para ele, aquele idiota de meia-idade. Ele está
chocado. Um portfólio cotado a cem vezes o lucro faz com que ele entre no
trauma de 1961. Ele está dividido entre a lembrança e o desejo.”
Stanley Druckenmiller passou por uma experiência semelhante.
Escrevi sobre como ele foi promovido por seu primeiro mentor precisamente por
causa de sua falta de experiência. Druckenmiller foi nomeado diretor de
pesquisa de ações “pelo mesmo motivo que eles enviam jovens de 18 anos para a
guerra”:
“Porque eles são burros demais para saber que não devem atacar.
As ações de pequena capitalização estão em um mercado de baixa há 10 anos [essa
conversa ocorreu em 1978], e acho que haverá um enorme mercado em alta
impulsionado pela liquidez em algum momento da próxima década. Francamente,
tenho muitas cicatrizes dos últimos dez anos, enquanto você não. Acho que
faremos um grande time porque você será muito estúpido e inexperiente para
saber que não é para tentar comprar tudo.”
Assim, quando a revolução iraniana começou, Druckenmiller
“colocou 70% do nosso dinheiro em ações de petróleo e 30% em ações de defesa”.
Ele foi com tudo em um trade óbvio por causa de sua juventude e inexperiência.
“Isso se chama pescar no fundo do mercado de ações. Muito,
muito difícil. Eu me dei mal com isso. A Standard Oil of Ohio este ano caiu de
90 para 60 e eu disse a todos que a ação não vai cair mais.
O trabalho de Lynch era escolher uma carteira de ações para
seus investidores e vencer o mercado. Aprender com seus erros era importante.
Mas era mais importante para ele não deixar nenhum resultado prejudicar seu
pensamento. Poderia ele ser eficaz se ficasse deprimido e se sentisse zangado,
derrotado e deprimido por dias ou semanas depois de sair de uma posição
perdedora?
George Soros foi aniquilado durante o crash de 1987, quando detonou
seu portfólio nas mínimas. Foi um momento que ilustrou duas características: a
ênfase de Soros na gestão de riscos (sobrevivência) e sua confiança em
encontrar oportunidades lucrativas no futuro. Druckenmiller o chamou de o
melhor perdedor que ele já viu:
“Se um trade não funcionar, ele está confiante o suficiente
sobre sua capacidade de vencer em outros trades que pode facilmente sair da
posição.”
No entanto, essa confiança em negociar lucrativamente no
futuro repousava na capacidade de Soros de se recuperar mentalmente de forma
rápida. Apenas algumas semanas depois do que Sebastian Mallaby chamou de
“talvez a pior decisão de sua carreira”, Soros assumiu uma “posição corajosa e
alavancada, como se nada de desagradável tivesse acontecido”.
No livro George Soros: A Life in Full, quando
questionado sobre as minúcias de uma especulação cambial, Soros brincou dizendo
que só conseguia “lembrar do futuro”.
Suspeito que Soros e Lynch, e talvez outros, tenham se
engajado no esquecimento seletivo e deliberado ou pelo menos na
compartimentação. Isso me lembrou Napoleão Bonaparte, que era muito bom em
remover distrações de sua atenção:
“Diferentes assuntos e diferentes situações estão
organizados em minha cabeça como em um armário”, disse ele uma vez a um
ministro. “Quando desejo interromper uma linha de pensamento, fecho aquela
gaveta e abro outra. Desejo dormir? Eu simplesmente fecho todas as gavetas e lá
estou eu – dormindo.” Como Vencer Guerras e Influenciar Pessoas: Andrew
Roberts sobre Napoleão Bonaparte
Isso não quer dizer que grandes investidores não tenham boas
lembranças (muitos parecem ter memória fotográfica) ou que não devemos investir
tempo em avaliações e em aprender com a história e o erro. Como disse Ray
Dalio: “dor mais reflexão é igual a progresso”.
Mas existe o perigo de ficar preso nesse ciclo de
contemplação de aprendizado orientado ao fracasso, que pode nos deixar com
dúvidas e hesitações. E quanto mais ênfase colocamos na memória e nas lições de
situações específicas, mais nos fechamos para situações que compartilham
semelhanças, mas devem ser vistas com novos olhos.
Em A importância do esquecimento, Lauren Gravitz
destaca pesquisas sobre pessoas que sofrem de “memória autobiográfica
severamente deficiente (SDAM)” – pessoas que são “incapazes de recordar
vividamente eventos específicos em suas vidas”. Curiosamente, os pesquisadores
descobriram que as pessoas com SDAM se saíram bem quando apresentadas a tarefas
que exigiam pensamento abstrato. Eles não foram limitados por uma vida inteira
de memória episódica.
No outro extremo do espectro, pessoas com “memória
autobiográfica altamente superior (HSAM)” têm uma memória excepcional de
minúcias, como a roupa que estavam em um determinado dia. No entanto, “esses
indivíduos tendem a não ser particularmente bem-sucedidos e parecem ter uma
tendência crescente à obsessão”, talvez porque sejam incapazes de “extrair-se
de instâncias específicas”. A força de suas memórias tornou-se uma gaiola
mental prendendo-os no passado.
“Por que temos memória? Como humanos, alimentamos essa
fantasia de que é importante ter detalhes autobiográficos”, diz Oliver Hardt,
psicólogo cognitivo que estuda neurobiologia da memória na Universidade McGill
em Montreal, Canadá. “E isso provavelmente está completamente errado. A
memória, em primeiro lugar, existe para servir a um propósito adaptativo. Ele
nos dota de conhecimento sobre o mundo e, em seguida, atualiza esse
conhecimento.”
Esquecer nos permite, como indivíduos e como espécie,
avançar.” Lauren Gravitz, A importância de esquecer
Depois de mostrar ao autor sua equipe de crianças, O Grande
Winfield explica:
“A força dos meus filhos é que eles são muito jovens para se
lembrar de algo ruim e estão ganhando tanto dinheiro que se sentem
invencíveis”, disse O Grande Winfield.
“Agora você sabe e eu sei que um dia a música vai parar de
tocar e o vento vai bater nas vidraças quebradas, e a expectativa disso nos
congela. Todos esses garotos, exceto um, estarão falidos, e esse será o
multimilionário, o Arthur Rock da nova geração. Sempre há um, e vamos
encontrá-lo.”
Aprendemos estudando a história e nossos próprios erros e
ações. Mas se nos agarrarmos às nossas memórias com muita força, nos fechamos
para o presente. Vemos novas situações através de um prisma envelhecido e
ultrapassado. Em sua busca por conhecimento e melhor compreensão, não tenha
medo de esquecer.
Esse artigo tem muita semelhança com o que vivemos
atualmente, as empresas de tecnologia estão dentro deste espectro. Para um
investidor mais antigo, é muito difícil convencê-lo a comprar uma empresa Start
Up cujo lucro projetado por alguns anos é prejuízo — afinal, aprendeu isso na
escola. Mas um jovem com pouca experiencia não fica chocado com essa situação
se acredita na ideia e na execução do time.
Minha vida sofreu uma grande mudança quando resolvi adotar a
análise gráfica como instrumento de tomada de decisão. Antes disso, como
poderia eu sair de uma posição de compra que era fundamentada e ficar vendido?
Não fazia sentido. A análise técnica tornou isso possível, e por trás existe esse
conceito de “esquecer” o passado.
Trouxe esse assunto motivado pela mudança que tive na
percepção das bolsas internacionais, onde agora tenho uma visão mais
construtiva. Você leitor pode estrar perplexo: como pode o Mosca estar
sugerindo comprar, com tanta coisa ruim nos rondando? Meu amigo já deve estar
pensando: Será que esse tolo não enxerga que vem uma recessão forte?” Posso dizer que tenho todos esses receios,
afinal não sou tão “tolo” assim! Mas o mercado está me mostrando diferente. E já
que ninguém sabe o futuro, em que devo acreditar? No mercado ou na minha
imaginação?
Posso estar errado nessa visão e daqui a algum tempo voltar
a ter uma estratégia de baixa. Por enquanto, porém, não é o que o mercado está
me dizendo. Tenho alguns cenários nesse sentido como — vai subir mais um pouco
e depois voltar a cair — mas e se não acontecer e continuar subindo, atingindo
novas máximas? Tenho certeza de que se isso ocorrer meu amigo vai pegar no meu
pé!
O que vou sugerir é que usem instrumentos líquidos de tal
forma que com um telefonema — melhor, com o WhatsApp — vocês saiam da posição. E
nunca esqueçam que o stop loss vai permitir que continuem no jogo.
Sobre esse assunto, fiquei intrigado com o gráfico a seguir, da volatilidade do índice de volatilidade. Parece estranho? Para simplificar, é a medição da volatilidade de um ativo que por coincidência mede a volatilidade da bolsa. Para quem gosta de matemática, é como se fosse a segunda derivada. Muito bem, vocês acham que esse índice poderia estar tão baixo com tanta coisa ruim? Só para pontuar, quando esteve na mínima apontada, a volatidade anualizada da bolsa estava em 12% e hoje ao redor de 20%. Bottom line: a volatilidade está super comportada.
No post a-busca-de-um-culpado, fiz os seguintes comentários sobre o Ibovespa: ... “Para que meu cenário prevaleça, uma correção de menor grau estaria em andamento cujo limite deveria estar contido no retângulo entre 99,1 mil/ 99,5 mil, depois a queda ganharia pulso. O que não gostaria que acontecesse seria uma continuação dessa alta cujo limite é 101,6 mil, local que vou estabelecer como novo stop loss.” ...
O assunto de hoje combina bem com essa situação em que o Mosca
fica aberto a dois cenários opostos sem que com isso tenha que justificar a
mudança de posição, ou melhor, a justificativa é o mercado. No nível atual, não
me sinto confortável em nenhuma das posições, razão pela qual liquidamos o
trade que estava em curso.
O SP500 fechou a 4.155, com alta de 1,56%; o USDBRL a R$ 5,2798,
sem alteração; o EURUSD a € 1,0168, sem alteração; e o ouro a U$ 1.764, com alta de
0,28%.
Fique ligado!
Comentários
Postar um comentário