Mudança estrutural #SP500

 


A minha geração teve que aprender a viver no curto prazo, era uma condição de sobrevivência financeira, pois os níveis de inflação eram de 10%, 20% e até 50% ao mês! Ao fazer a conta da taxa anual nem precisa subtrair 1 da fórmula:

ianual = ((1+i/100+1) ^12) - 1 (é esse 1 que eu me refiro)

Não acreditam? Substituam i = 50% a.m. e calculem o resultado ao ano.

Resultado correto = 12.874% a.a. ou 12.974% a.a. sem subtrair o 1.

Demorou muitas décadas até que tivéssemos uma inflação mais razoável. Em relação aos juros demorou um pouco mais, a queda do juro real só foi significativa a partir de 2019.

Durante minha vida como profissional, e principalmente depois do ano 2.000, não tinha muito sentido se aventurar no risco, era só comprar um papel rendendo 100% do CDI que dificilmente um outro ativo renderia melhor.

Mas a partir de 2018, essa fórmula precisou ser revista, primeiro se desapegando do CDI, depois se desapegando da renda fixa. Por essa razão tenho insistido tanto em informações e dados para auxiliar o leitor nessas mudanças.

Investir em ativos de renda variável é uma jornada. Na primeira vez que se aventura nesse caminho, tudo parece maravilhoso, mas com o passar do tempo os percalços acontecem, e a partir daí a convivência com o risco vai formando a cabeça do investidor.

Tenho persistido no conceito de alocação de portfólio, ou em outras palavras, qual a percentagem do patrimônio em risco mais adequada a cada pessoa. O prazo é outro fator muito importante — ao se investir em ativos de risco, não se pode esperar retornos imediatos, pois se é esse o objetivo se trata mais de jogo que de investimento.

Toda essa introdução me traz ao tema de hoje, baseado na publicação de Ben Carlson, que usou um trabalho publicado pelo Deutsche Bank sobre o retorno dos últimos 200 anos nos EUA.

A pesquisa de Reid mostra os retornos reais históricos em ações, títulos, dinheiro, imóveis e commodities em vários períodos diferentes:



Há muita informação nessa tabela e isso pode ser difícil de ler para quem não tem uma vista tão boa como a minha (desculpe a modéstia), então vamos focar em alguns desses números.

Estes são os retornos anuais reais (pós-inflação) para as ações dos EUA, títulos de 10 anos, investimentos de curto prazo – Cash - e commodities:


Algumas observações:

Os retornos de curto prazo para o mercado de ações podem ser altamente imprevisíveis e instáveis. Os retornos de longo prazo para o mercado de ações têm sido muito mais estáveis. Embora os retornos reais tenham sido elevados nos últimos 5 e 10 anos, não há muita diferença entre retornos além de 15, 25, 50, 75, 100, 150 ou 200 anos.

Isso é reconfortante, mesmo que retornos futuros não sejam garantidos a ninguém.

Também é um bom lembrete de que os altos retornos no ciclo atual não durarão para sempre. Não funciona como configuração de iPhone, mas eventualmente retornos acima da média serão seguidos por retornos inferiores à média.

Os retornos têm sido muito maiores do que as médias de longo prazo desde 1980, mas você pode ver que os números desde 1999 estão jogando fora alguns desses excessos.

As taxas de juros estão extremamente baixas desde a Grande Crise Financeira, mas os números dos últimos 5, 10 e 15 anos mostram como a segurança do dinheiro no curto prazo —Cash — pode prejudicá-lo no longo prazo.

Cash e títulos de curto prazo certamente podem ser úteis quando você precisa gastar seu capital no curto prazo, mas se você espera bater a taxa de inflação no longo prazo, precisa aceitar algum risco em sua carteira.

Sentar-se no Cash sempre será mais seguro do que investir no mercado de ações, mas o mercado de ações lhe dá chances muito maiores de aumentar seu padrão de vida.

O desempenho das commodities também pode ser surpreendente para alguns investidores. As commodities têm tido retornos reais negativos nos últimos 100 anos! Mas pode haver algum viés de seleção aqui. Você pode ver pelos números de Reid que o ouro tem um histórico muito melhor.

Mas eu considero esses resultados positivos. Mostram o progresso, a inovação e a tecnologia como uma força deflacionária no mundo e que a maioria dos preços das commodities não acompanha a inflação.

Muitos investidores querem investir em commodities hoje por causa das preocupações com a inflação. E as commodities podem ter altos retornos em ambientes inflacionários.

Mas as ações têm um histórico muito melhor em relação à taxa de inflação no longo prazo.

Agora aqui estão os retornos reais anuais por década:



Você provavelmente pode jogar fora os retornos de 1800, mas eu gostaria de saber o que estava acontecendo na década de 1840 para causar um desempenho tão maravilhoso no geral. Acho que a corrida do ouro foi boa para os mercados.

Uma década parece muito tempo, mas pode não ser digna de consideração quando se trata de "longo prazo" para o mercado de ações. Em 3 das últimas 11 décadas, o mercado de ações viveu retornos reais negativos.

Isso é uma década perdida, o que é uma coisa boa para os poupadores, mas uma coisa ruim para os investidores. O risco de uma década perdida explica os retornos consistentemente altos em períodos muito mais longos. Décadas perdidas também são um bom lembrete para a importância da diversificação. Muito sucesso no investimento é baseado na sorte e no momento certo (destaque meu, comentado a seguir).

Pode haver retornos reais negativos sobre os títulos por um longo período. A extensão de quatro décadas entre os anos 40 e 70 mostrou retornos reais negativos para títulos.

O Cash teve retornos reais negativos em 5 das últimas 11 décadas. Você provavelmente pode prever que isso continue a partir de taxas tão baixas no momento.

Há um ótimo argumento de que os retornos nos próximos 50-100 anos serão menores do que foram nos últimos 50-100 anos. Há simplesmente mais conhecimento sobre os mercados agora, uma garantia implícita do Fed, taxas de juros mais baixas e avaliações cada vez maiores.

Por outro lado, os custos nunca foram mais baratos, as barreiras à entrada para se investir nunca foram menores, há mais produtos de investimento disponíveis do que em qualquer outro momento da história e uma inovação contínua em serviços financeiros.

Embora os retornos brutos provavelmente sejam menores, os retornos líquidos devem ser maiores para quem é capaz de evitar erros comportamentais.

A maior ameaça aos retornos a longo prazo é o seu comportamento a curto prazo.

Eu destaquei a sorte e o momento certo como fatores importantes do horizonte de investimento. Como ambos os atributos não estão no nosso domínio, só saberemos ex-post como caracterizar sua entrada. Entretanto, se você já tem uma idade mais avançada, isso pode fazer muita diferença.

Keynes dizia que no longo prazo estaremos todos mortos. Quando alguém comenta sobre esse horizonte – no longo prazo - nos investimentos, é uma grande verdade, porém a alternativa de se posicionar de forma conservadora por esse receio não parece ser uma boa estratégia.

Se o leitor esperava que eu tivesse uma receita de bolo, deve estar frustrado, pois não existe tal milagre. Entretanto, poderia resumir que a arte de investir se resume num bom “Asset Allocation” e uma gestão ativa de parte da carteira, de acordo com um outro parâmetro de prazo mais curto —no meu caso, a Análise Técnica. Como diz o título do post, é necessária uma mudança estrutural em relação ao passado. Continuo surpreso com a quantidade de investidores que ainda têm aplicações indexadas ao CDI!

No post queda-inesperada, fiz os seguintes comentários sobre o SP500: ...” inicialmente a queda poderia se situar entre 4.100/4.085 que se rompida levaria o índice a 4.040/4.030. Não tenho preferência por nenhuma delas, sendo ambas equiprováveis” ...



O SP500 acabou subindo um pouco mais, e hoje pela manhã atingiu 4.234 igualando a máxima ocorrida no mês de maio, para em seguida se retrair. A queda que está ocorrendo pode ser a que estou esperando. Como comentei acima, essa retração poderia ter dois formatos: uma menos extensa que levaria o índice entre 4.170/4.125; ou uma maior que poderia levar o SP500 para 4.050.



A linha em laranja denota o percurso da segunda alternativa, que considero com uma pequena vantagem sobre a primeira. Notem que o objetivo final, depois dessa queda, seria ao redor de 4.740, que será mais bem calculado no futuro.

- David, como saberemos se é o primeiro ou o segundo caso?

Em situações como esta, recomendo que se fique com os dois cenários, pois evita entradas prematuras. Para responder sua pergunta, diria para ficar atento nos próximos dias e dependendo do que ocorrer em intervalos menores, se poderá optar por uma das duas.

O SP500 fechou a 4.200, sem alteração; o USDBRL a R$ 5,1520, com queda de 1,25%; o EURUSD a 1,2218, sem alteração; e o ouro a U$ 1.899, com queda de 0,46%.

Fique ligado!

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