Clinicando sem exames #Ibovespa

 


A medicina é uma profissão totalmente estatística: qualquer decisão que seu médico toma é em cima de probabilidades. Essa conclusão eu tive com o passar dos anos; quando era mais jovem, não tinha essa percepção e acreditava que aplicar o remédio A era certeza de ficar curado. Naturalmente, não é com meia dúzia de experimentos que se chega a alguma conclusão de tratamento, mas sim com uma série histórica estatisticamente válida. Mas não existe certeza!

Ontem comentei que, caso a economia não entre em recessão, o mercado de juros teria que uma correção mais forte —os juros mais longos, principalmente, deveriam subir substancialmente. Mas a curva de juros está indicando que deveríamos esperar uma recessão — é certeza segundo a história, como comenta Robert Armstrong em seu site Unhedged.

Interrogando a curva de juros

Ontem escrevemos que "não gostamos de apostar contra a curva de rendimentos de três meses/10 anos". Pensando bem, parece-nos que essa simples aposta – a favor ou contra o sinal recessivo enviado pela curva de juros – tem sido a questão definidora nos mercados nos últimos 18 meses. Nada mais importa tanto, e todos os outros importantes debates financeiros e macroeconômicos estão intimamente relacionados. E como os fatos relevantes para a aposta estão mudando, vale a pena revisitar o debate.

Comece com o gráfico familiar ou a curva dos últimos 40 anos:




Todas as cinco inversões nas últimas quatro décadas previram recessões e não houve falsos positivos. Como acontece com toda correlação, uma explicação convincente é necessária para que a causalidade seja inferida. E, neste caso, a explicação é muito simples e poderosa.

Uma inversão de curva nada mais é do que o Federal Reserve aumentar as taxas de juros de curto prazo acima da taxa de juros neutra da economia (a taxa que não alimenta a inflação nem aumenta o desemprego). Ninguém sabe exatamente o que é a taxa neutra – mas as taxas de juros de longo prazo são algo como uma aproximação do mercado dela (ajustadas pela inflação). Taxas curtas bem acima da taxa neutra desaceleram a economia. Na verdade, eles a retardam até que a recessão ocorra, em parte porque o impacto da política de juros na economia é imprevisível e defasado, de modo que os formuladores de políticas tendem a manter o aperto por muito tempo.

Nessa explicação, a profundidade da inversão provavelmente importa. Na medida em que as taxas longas acompanham a taxa neutra, uma grande diferença com as taxas curtas indica uma política mais apertada. Por isso, vale destacar que em 2023 a inversão se tornou historicamente profunda, como mostra o gráfico.

No entanto, vários sinais do mercado – preços de ações, spreads de crédito, volatilidade – parecem desprezar a inversão. Mais surpreendente ainda, partes da própria economia parecem estar zombando da curva com demonstrações de força. O grande aumento de lançamentos imobiliários desta semana é apenas o exemplo mais recente. É preciso perguntar se desta vez este indicador eminentemente sensato e super fiável pode estar errado.

Há duas maneiras básicas de desmentir a curva de juros em meados de 2023.

A primeira maneira é argumentar que estamos em um ciclo econômico incomum, no seguinte sentido. Há um aperto que é suficiente para derrubar a inflação; chame esse valor de X. Depois, há um aperto que vai forçar a economia à recessão; chame isso de Y. A ideia é que, ao contrário dos ciclos passados, X seja menor que Y, e o Fed pare em X.

Então, por que esse ciclo pode ser diferente? Uma visão é que o atual surto de inflação é o resultado defasado de uma série de choques de oferta que estão afetando a economia. O excesso de demanda de estímulos não é um contribuinte importante. O reforço da política, que é um instrumento para destruir a procura, é, portanto, quase desnecessário. Como tal, X é menor que Y.

Outra versão da história do "X é menos que Y" é que o mercado de trabalho estava extremamente apertado antes da inflação começar, o que significa que o Fed pode destruir um pouco da demanda antes que muitas pessoas sejam demitidas (e muitas pessoas sendo demitidas é o que define uma recessão, na verdade). Esse é o tipo de visão que Chris Waller, do Federal Reserve, adotou em seu famoso artigo sobre vagas de emprego.

Você pode fazer um argumento análogo substituindo poupanças extraordinárias das famílias por vagas de emprego e gastos resilientes do consumidor por empregos resilientes. Tudo o que você precisa é que a poupança dure até que a inflação passe e a política afrouxe.

Campbell Harvey, professor da Duke e diretor de pesquisa da Research Affiliates, considerou que X era menor que Y, e que o Fed acertaria o timing ainda em janeiro deste ano. Sua visão então era que o mercado de trabalho era de fato extraordinariamente forte e o sistema financeiro estava em melhor forma do que antes das recessões passadas, particularmente 2008. Ele pensou então que a curva estava enviando um sinal falso – o que é interessante, em parte, porque ele é geralmente creditado por ter sido o primeiro a demonstrar a conexão entre inversões e recessões, nos anos 1980.

Harvey acha que as coisas estão diferentes agora, no entanto. Ele acha que a inflação está caindo rapidamente, e o aperto do Fed expôs fraquezas no sistema financeiro, como demonstrado pelas falhas bancárias desta primavera. Quando falei com ele ontem, ele apontou para a profundidade "histórica" da inversão e argumentou que mais aumentos colocarão a economia em perigo real. Em suma, ele acredita na curva agora.

A segunda maneira de desmentir a curva de juros é sugerir que as taxas longas se tornaram irremediavelmente distorcidas – são muito baixas, essencialmente – e, portanto, a curva não envia mais um sinal confiável. É comum culpar os programas de compra de títulos do Fed pelas distorções. Tudo o que você realmente precisa, no entanto, é um argumento de que os títulos de 10 anos estão mal precificados e que seus rendimentos devem ser mais altos (o que significa que a curva de rendimento "real" é mais rasa do que a aparente).

Michael Howell, da CrossBorder Capital, por exemplo, aponta para o desaparecimento do prêmio para os Treasuries mais longos. O prêmio é uma medida da diferença entre as taxas longas e a trajetória esperada das taxas curtas. Ele compensa os investidores pelo risco de que a perspectiva de juros mude. O prêmio está atualmente negativo (na estimativa do Fed de Nova York) e perto de uma mínima histórica. A compensação negativa para o prazo é estranha, e Howell diz que é uma evidência de que os preços dos Treasuries de longa data não são impulsionados por fundamentos de taxas, mas sim pela demanda por títulos de longo prazo livres de risco para uso como garantia. A curva está enviando sinais ruins como resultado.

Unhedged, por outro lado, acha que a curva de juros está dizendo a verdade, e que uma recessão está a caminho. Com todas as ressalvas usuais sobre a insensatez do prognóstico econômico de curto prazo, adotamos essa visão por três razões:

  1. As fontes de excesso de procura de que atualmente dispomos, tais como elevadas poupanças dos consumidores e um mercado de trabalho apertado, podem revelar-se transitórias. Muitos indicadores econômicos parecem muito fortes até o momento em que uma recessão começa. Nos termos usados acima, Y tende a ser menor do que você pensa que é, quando a coisa é para valer.
  2. A razão pela qual o Fed muitas vezes aperta demais é que acertar o timing é muito difícil. Por que seria mais fácil desta vez?
  3. Embora sejamos simpáticos à ideia de que os rendimentos de 10 anos estão distorcidos, as taxas de longo prazo vêm caindo constantemente há muito tempo, basicamente em todos os lugares. A taxa neutra pode ser superior a 3,7% (o rendimento atual em 10 anos), mas provavelmente não tão alta assim.

Achamos que uma recessão está chegando no próximo ano. Com alguma sorte, será suave.

Se finanças fossem como a medicina, o Fed teria que assumir que uma recessão ocorreria em algum momento à frente, mas será que cinco ocorrências são suficientes para tal conclusão? Acredito que mesmo um médico teria forte restrições para aplicar algum “medicamento” nesse caso. Por outro lado, será razoável negar esse fato e não levar em consideração essa história?

Mas o que é recessão, como se pode constatar? A resposta padrão é "dois trimestres consecutivos de crescimento negativo do PIB". No entanto, essa resposta é perigosamente enganosa, especialmente do ponto de vista de investimentos. A definição "oficial" de recessão nos EUA usada pelo National Bureau of Economic Research não faz referência aos números trimestrais do PIB. O NBER tem boas razões para definir uma recessão de forma muito mais ampla: "um declínio significativo da atividade econômica que se espalha por toda a economia e dura mais do que alguns meses", medido por uma ampla gama de dados – renda pessoal real, folhas de pagamento e emprego das famílias, gastos reais de consumo, vendas no atacado e varejo e produção industrial – que notadamente não inclui o PIB trimestral.

Definir uma recessão com precisão é importante porque, em recessões genuínas, o funcionamento normal de uma economia de mercado é completamente invertido. Em tempos normais, as economias de mercado são alimentadas por um círculo virtuoso de crescimento econômico positivo que cria mais emprego, mais renda, mais demanda e, portanto, mais uma rodada de crescimento positivo. Mas, nas recessões, essa sequência se inverte em um círculo vicioso. O crescimento negativo leva à queda do emprego, à queda da renda, à queda da demanda e aos deslocamentos financeiros, levando a um crescimento ainda mais negativo.

Crucialmente, a força motriz que pode transformar uma economia de um círculo virtuoso para um círculo vicioso não é uma desaceleração nos dados do PIB; é uma inversão no emprego e, portanto, na renda pessoal. Emprego e renda geralmente se movem na mesma direção do crescimento do PIB, então dois trimestres de PIB negativo são, portanto, um atalho útil para reconhecer recessões. Mas pode haver momentos em que o PIB caia enquanto o emprego e a renda continuam subindo, como ocorreu nos EUA no ano passado.

Em momentos como estes, dois trimestres de queda do PIB, vagamente descritos como uma "recessão técnica", podem não produzir uma recessão genuína no sentido de um ciclo negativo de queda do emprego, da renda e da demanda agregada, levando a novas quedas no emprego. Uma recessão deve ser "espalhada por toda a economia", porque termos como "recessão industrial", ou "recessão imobiliária" ou "recessão energética" são erros econômicos.

Um motivo de preocupação é que os investidores se concentram demasiadamente nas previsões de pequenas mudanças no PIB trimestral, exageraram a probabilidade de uma recessão nos EUA este ano. Se a economia dos EUA continuar crescendo este ano, o atual superaquecimento inflacionário continuará, e o Fed poderá em breve ser forçado a decidir entre aumentar as taxas de juros muito além das expectativas do mercado ou aceitar uma inflação maior de 4%.

Talvez a simplicidade de nomear a recessão da maneira como os analistas enxergam, de dois trimestres com PIB negativo, pode enganar a real condição da economia americana, só uma visão mais ampla pelo NBER é genuína. Com todas essas considerações, não sei se compro a ideia da curva de juros — mas não tenho como provar, somente o tempo dirá.

No post atuações-emotivas fiz os seguintes comentários sobre o Ibovespa: ... “A bolsa brasileira continuou a subir e encontra-se agora numa situação crítica para o cenário que estou trabalhando. Mas não tenho problema de mudar de direção caso o movimento que ocorre indique isso. A linha na areia é 120.800, caso seja ultrapassada é provável que o movimento de queda que eu estava esperando não ocorra e o movimento de alta está em curso” ...




Nesse post apresentei duas possibilidades para o caso de a bolsa ultrapassar a marca de 120.800, que recomendo seja revisitado para melhor compreensão. A bolsa se encontra muito próxima desse nível. Nessas situações, o recomendável é ficar observando, e naturalmente essa opção tem um custo que seria entrar no mercado “mais tarde”.

Quando o quadro é obscuro em observações de janela de 1 dia, recomendo observar numa janela de 1 semana ou até maior, assim se esquiva dos eventuais vieses de curto prazo. No gráfico a seguir, procuro apontar o que devemos avaliar nas próximas semanas.

Incialmente apontei que em cinco ocasiões a bolsa tentou romper o que está destacado em verde 121 mil – 131 mil, pode ser que agora seja a hora desse rompimento, mas essa área é de muito peso na análise técnica.

Existe também a formação do que se denomina de ombro (esquerdo) – cabeça – ombro (direito). Segundo essa formação por enquanto não houve rompimento para baixo anteriormente, pois a reta azul “segurou” todas as tentativas.




Como ficamos? Se o Ibovespa romper essa barreira, é provável que uma alta mais expressiva esteja em andamento. Caso isso ocorra, como podem notar dentro do retângulo em laranja, vou aguardar a formação das cinco ondas, ou até buscar entradas antes mesmo de completar. Caso contrário, uma queda deveria levar a bolsa para o nível de 92,5 mil — podermos também nos entreter com alguma posição.

Agora, podem estar certos de que muita água vai rolar antes do intervalo entre 121 mil – 131 mil clarear; acho muito, muito difícil passar numa boa.

O SP500 fechou a 4.365, com queda de 0,51%; o USDBRL a R$ 4,7665, com queda de 0,47%; o EURUSD a 1,0987, com alta de 0,65%; e o ouro a U$ 1.932, com queda de 0,18%.

Fique ligado!

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