Por trás da fumaça



Talvez o leitor fosse levado a supor que o Mosca trataria hoje da mais recente polémica nacional, as queimadas no Amazonas. Para que esse assunto não se estenda, como poderia eu opinar sobre algo que não conheço, seria pura especulação.

O meu objetivo é comentar sobre a Europa, que segundo a Gavekal, é o maior risco na atualidade, porém está encoberto pelo confronto entre EUA e China.  A verdadeira ameaça de recessão atual vem da Europa e surge de duas ideologias: a crença da Alemanha de que está isenta dos princípios da gestão da demanda keynesiana e a crença da Grã-Bretanha que é isenta dos princípios da vantagem comparativa ricardiana.

Para entender veja a tabela abaixo, especificamente a coluna da direita. Isso mostra como as projeções de crescimento para 2019 mudaram entre o verão de 2018 e a última atualização do Fundo Monetário Internacional, publicado em julho. Embora o crescimento global tenha obviamente enfraquecido desde que o Trump lançou a guerra comercial EUA-China em maio-junho de 2018, muito pouco da dor tem sido sentida pelos EUA ou pela China.

De fato, nos últimos 12 meses, os EUA e a China continuaram a se expandir em torno de suas taxas de crescimento, enquanto o principal dano foi sofrido pela Europa (especialmente a Alemanha e a Itália) e alguns países semanticamente menos importantes, como Rússia, México e Canadá, que foram particularmente expostos a sanções dos EUA ou tweets Trump.


Apesar de toda a conversa sobre uma recessão nos EUA e uma desaceleração na China, os dados econômicos americanos se fortaleceram levemente em relação às expectativas de outubro passado (a projeção de crescimento para 2019 subiu 0,1 pp), e não houve enfraquecimento nos dados chineses. Os dados da zona do euro, por outro lado, deterioraram-se dramaticamente, respondendo por quase todo o rebaixamento para crescimento global (desde o Japão, a Grã-Bretanha e a maioria das economias emergentes não mudou muito). Dentro da zona do euro, a Alemanha sofreu uma queda muito maior do que qualquer outro país, mesmo com a Itália contabilizando menos que às expectativas.

Por que a guerra comercial EUA-China causou tanto dano à Europa, enquanto deixando os dois beligerantes ilesos? Uma razão óbvia é que o a zona do euro é mais dependente do comércio do que outras grandes economias. As exportações desse bloco (excluindo o comércio dentro da zona) representam 28% do PIB, comparado a 12% para os EUA, 19% para o Japão e 20% para a China. No entanto, outra explicação para o aparente paradoxo da cultura de vitimização econômica da Europa é muito mais relevante para os mercados financeiros: a divergência diametral nas políticas de gestão entre a zona euro e os EUA ou a China.

Desde o início de 2017, a Europa continuou consolidando agressivamente os déficits e rigorosas regulamentações bancários e requisitos de capital. Enquanto isso Trump se envolveu numa enorme expansão fiscal e a China expandiu significativamente o crédito. Dadas essas políticas divergentes entre a Europa e EUA-China desde o início da guerra comercial, não deve surpreender. É simplesmente a última confirmação das principais percepções da economia keynesiana, cujos princípios não foram utilizados por eles.

Se a UE embarcar nos próximos meses numa política decisiva de reflação, Os ativos europeus poderiam avançar fortemente, como fizeram após o programa de 2015 de flexibilização quantitativa. Isso é possível - e facilmente acessível, especialmente para Alemanha, mas ainda não é muito provável. Se, por outro lado, continuam as atuais políticas de consolidação fiscal, a UE quase certamente afundará em uma profunda recessão e poderá muito bem experimentar turbulência política e financeira pior que a crise do euro de 2010-12.

Qual destas opções a Europa tomará dependerá em grande parte dos políticos tirar as lições certas do terrível desempenho econômico desde meados de 2018, especialmente na Alemanha. China e Estados Unidos evitaram qualquer enfraquecimento econômico, apesar de sua crescente guerra comercial, usando a política fiscal para garantir que a demanda doméstica cresça com força suficiente para compensar qualquer desaceleração nas exportações. Por outro lado, na Europa, e especialmente Alemanha, a demanda doméstica tem sido fraca demais para acompanhar taxas de crescimento potencial.

Infelizmente, a visão de que a Europa havia retornado um crescimento auto-sustentável
estava completamente errado. Em vez de crescimento doméstico sustentável, a Europa estava redescobrindo seu apego às exportações. O crescimento incremental em 2017, e no início de 2018 veio principalmente de um surto temporário no comércio, especialmente com a China, enquanto a demanda doméstica já estava diminuindo. A situação foi particularmente
perigosa na Alemanha, que se tornou completamente viciado em exportações
um paliativo por sua fraqueza crônica na demanda doméstica, especialmente nos negócios
e investimento do governo.

Este desafio pode atingir a Europa muito mais cedo do que políticos ou investidores esperam, basta que os líderes da UE manejem mal seu confronto com a Grã-Bretanha, o segundo maior mercado de exportação da zona do euro (depois dos EUA), que no ano passado comprou quase o dobro da Europa quando comparado com a China (12% das exportações da zona do euro versus 7%). A ameaça de um conflito definitivo entre a EU e a Grã-Bretanha é um risco muito maior para a economia mundial do que qualquer coisa que pode acontecer entre os EUA e a China nos próximos 12 meses.

A adoção de uma moeda única com rígidos controles de déficit público impostos aos países que aderiram ao euro, criou inúmeras distorções entre os países, que não podem se utilizar da taxa cambial para enfrentar dificuldades. A Europa no passado era liquidamente demandadora de capital, agora é liquidamente poupadora, fruto de um euro desvalorizado que impulsionou principalmente a Alemanha a exportar uma grande parte de sua produção, como exposto acima.

Usando unicamente a política monetária não será suficiente para tirar a Europa da estagnação que vive atualmente. E caso isso não seja reconhecido pelos governantes o risco real de uma recessão venha dessa região e não dos EUA ou China. Será que o ECB sob nova gestão conseguira convencer os burocratas da Bélgica?

No post o-desconhecido-conhecido, fiz os seguintes comentários sobre o Ibovespa: ... “estabeleci o nível de 96.000 como stoploss, o motivo pode ser visto no gráfico com janela semanal abaixo” ... ... “quero evitar de ter posições abaixo desse nível. Como coloquei no gráfico “ eu não gostaria”. Mas se isso acontecer, noto alguns pontos como “desmotivadores” da alta. O primeiro é 95.000, fica ruim; depois 93.000, fica pior; e por último abaixo de 90.000, aís sim ficaria péssimo” ...

Nos últimos dias, a alta que parecia estar se formando depois de atingir 98.000, foi integralmente revertida ameaçando nosso stoploss. Como destaco a seguir, o shape dos últimos 30 dias é típico de uma correção de queda, isso daria um certo alento a nossa posição, mas não é suficiente para ficarmos tranquilo, pois a mesma pode se estender.


Ao refletir sobre esse trade fiquei propenso a liquidar muito próximo ao preço de entrada, pois considerado diversos aspectos o upside não é brilhante, como venho enfatizando há alguns meses. A não ser que essa última onda se prolongue, o objetivo calculado é 110.000.

O que me deixa mais temeroso é uma possibilidade de queda de 6% para o SP500, conforme explicitei no post sob-suspeita: ... “Eu ainda continuo com a ideia que o SP500 deverá retroceder até o nível de 2.730” ... Nessa última rodada de queda, as bolsas ao redor do mundo agiram de forma sincronizada. Por outro lado, o risco de manter não é muito elevado de 2% para um eventual ganho de 12%.

Analisando tudo, um fator que pesou de forma decisiva é quando se tem dúvida o melhor é não ter posições. Nessas situações não se deve adotar uma atitude estática, só porque a posição está feita. Argumentos do tipo: se subir não vou conseguir entrar de novo; ou o prejuízo é baixo, distorcem a real intenção. Nada disso, vai contar no futuro, pois numa posição zerada a memória deve ser reset.

O SP500 fechou a 2.869, com queda de 0,32%; o USDBRL a R$ 4,1310, com queda de 0,64%; o EURUSD a 1,1089, com queda de 0,10%; e o ouro a U$ 1.541, com alta de 1,10%.

Fique ligado!

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