Os Justiceiros #SP500

 


Me recordo bem quando nos anos 80 eu estava assistindo a uma conferência internacional e o apresentador comentou que, se o banco central americano não agisse, os Bond Vigilantes iriam entrar em ação. Na hora não entendi a quem ele estava se referindo; quem era essa figura? será que o banco onde eu trabalhava também poderia contratar esse serviço para me controlar? Fiquei inibido de perguntar quem eram esses “vigilantes”. Depois fui saber que era uma expressão figurativa dos traders de bonds do mercado. A expressão pode se traduzir como “Os Justiceiros dos Títulos”

Depois desse momento, nunca mais ouvi essa expressão novamente, mas um artigo de Bill Dudley na Bloomberg diz que os Bond Vigilantes vêm aí. Se o governo não fizer nada a respeito dos problemas fiscais, o mercado irá fazer.

Ainda no início da década de 1990, os líderes americanos se preocupavam muito com a forma como os investidores em títulos reagiriam às suas decisões. James Carville, estrategista político de Bill Clinton, disse que gostaria de reencarnar como o mercado de títulos, porque “você pode intimidar todo mundo”.

Desde então, eles pararam de se importar. É uma pena: os Bond Vigilantes podem vir buscá-los daqui a pouco.

Durante a maior parte das últimas duas décadas, o mercado de títulos tem sido notavelmente tranquilo. Os rendimentos em geral têm sido baixos, e o prêmio de prazo – a diferença média entre os rendimentos do Tesouro de longo e muito curto prazo – caiu para cerca de zero, de mais de 100 pontos-base antes da crise financeira de 2008. O desaparecimento do prêmio indicava uma extrema falta de preocupação com o risco de inflação mais alta ou com a sustentabilidade das finanças do governo dos EUA.

Isso está para mudar, por pelo menos três razões.

Primeiro, o contexto econômico está evoluindo. Durante o período de crescimento lento que prevaleceu após 2008, os pagamentos de juros garantidos dos títulos proporcionaram uma proteção contra a recessão e contra o risco de as taxas de curto prazo ficarem presas no limite inferior zero. Mas desde o aumento dos preços ao consumidor no ano passado – que levou a um aumento de 2 pontos percentuais no rendimento e a um declínio de 15% no preço dos títulos do Tesouro de 10 anos –, eles são percebidos como muito mais vulneráveis ao risco de inflação mais alta.

Em segundo lugar, os EUA estão tomando emprestado demais. O Escritório de Orçamento do Congresso estima que o déficit orçamentário federal excederá 5% do produto interno bruto na próxima década, elevando a dívida federal total detida pelo público para um recorde de 118% do PIB, excedendo o pico anterior no final da Segunda Guerra Mundial. E isso é provavelmente uma subestimação, dado que o CBO está fazendo três suposições otimistas: que os custos de empréstimos de longo prazo do governo serão menores do que são agora, que os cortes de impostos promulgados em 2017 expirarão no final de 2025 e que a atual expansão econômica continuará por mais 10 anos.

Em terceiro lugar, nem o presidente Joe Biden nem o Congresso provavelmente abordarão os problemas fiscais do governo em breve. Embora tanto o governo Biden quanto os republicanos da Câmara estejam defendendo a prudência, eles não poderiam estar mais distantes sobre como proceder. Biden supostamente quer arrecadar US $ 2 trilhões na próxima década, aumentando os impostos sobre famílias ricas e grandes corporações. Os republicanos, por outro lado, querem cortar gastos - mas principalmente por meio de cortes draconianos em programas cruciais da rede de segurança social, como cupons de alimentação, em vez de reformar os grandes programas de benefícios, a Previdência Social e o Medicare.

A questão principal, então, é quando os investidores em títulos reconhecerão os riscos e responderão de acordo. Quando esse momento chegar, provavelmente acontecerá rápido e crescerá por si mesmo. A fraca demanda por títulos do Tesouro elevará os custos de empréstimos do governo, piorando ainda mais suas finanças e deixando os investidores ansiosos. A espiral ascendente dos rendimentos persistirá até que os políticos sejam forçados a se comprometer e agir de maneira mais fiscalmente responsável.

Um gatilho potencial: o teto da dívida federal. Esse limite arbitrário de empréstimos provavelmente será atingido em algum momento deste verão, tornando o Tesouro incapaz de cumprir todas as obrigações do governo. O Congresso sempre conseguiu evitar tal desastre no passado, mas desta vez pode ser diferente: o presidente republicano da Câmara, Kevin McCarthy, pode perder seu cargo de presidente da Câmara se fechar um acordo, e o presidente Biden disse que não negociará, porque as dívidas em questão representam decisões fiscais e de gastos que os legisladores já tomaram.

O fracasso em chegar a um acordo seria um choque para os mercados financeiros, que esperam um compromisso de última hora, como aconteceu no passado. Mesmo que o Tesouro consiga priorizar os pagamentos e evitar um calote total na dívida do governo, os investidores se perguntarão por quanto tempo ele pode continuar fazendo malabarismos. Além disso, a contração acentuada relacionada nos gastos do governo prejudicaria diretamente a economia: a receita recebida provavelmente seria suficiente para cobrir apenas 65% a 75% dos gastos não relacionados ao serviço da dívida.

Atingir o teto da dívida seria a pior e mais estúpida maneira de lidar com déficits orçamentários insustentáveis. Só se pode esperar que os políticos de alguma forma caiam em si e cheguem a um acordo sobre uma consolidação fiscal responsável, antes que os Bond Vigilantes os obriguem.

Acredito que a crise bancária que está ocorrendo desde a semana passada vai de alguma forma levantar os pontos colocados por Dudley. Imagino que em breve algum analista vai calcular qual o prejuízo embutido na carteira do Fed, com 1/3 da dívida de longo prazo americana que monta a U$ 31 trilhões. Uma conta grosseira leva a um ajuste de U$ 1,0 trilhão para fazer a marcação a mercado e uma despesa de juros anual da ordem de U$ 1,5 trilhão, embora essa última seja de responsabilidade do tesouro.

Guardada as devidas proporções, a mesma discussão que ocorre aqui com o ajuste fiscal vai ser um ponto a ser considerado também nos EUA, e se os políticos acharem tudo bem ir rolando, algum dia o mercado vai achar que não, e os Bond Vigilantes começarão a se desfazer dos títulos e criarão um círculo vicioso onde a taxa de juros entre os títulos de 2anos e 10 anos não ficaram mais negativas, mas sim, muito positivas. Nem quero nem pensar no que pode acontecer com o dólar.

Outro ponto que me fez refletir esta última semana é a velocidade com que o contágio ocorre hoje em dia, com a ação de uma empresa virando pó em 24 horas. Sim, porque cair 60%/70% num dia equivale a perder quase todo seu valor, fazendo com que o eventual stop loss associado a essa ação não proteja em nada o capital do investidor. Em função dessa observação, sugiro comprar opção de venda das ações que você detenha, bem fora do dinheiro como se diz, tipo 30% abaixo do valor atual, para evitar perdas inesperadas como essa. O melhor ainda, somente ter na carteira ETF de índices compostos por muitas ações. Mas, se mesmo assim decidir manter ações especificas, que seja a menor parcela de seu portfólio.

Ainda nesse conceito, mesmo os títulos mais líquidos podem sofrer oscilações inesperadas fora do contexto. Por exemplo, veja a seguir o que ocorreu com a curva de juros nos EUA de uma semana para outra – na verdade, o grande movimento ocorreu ontem.



Muita gente deve ter perdido as calças, pois parecia certo de que o Fed iria continuar subindo os juros ainda mais do que o mercado esperava, como Powell indicou na última terça-feira. Não tiro a culpa das autoridades monetárias, no caso o Fed, por não saber do risco que esses bancos corriam — e não era um banquinho qualquer. Se tivessem agido antes, teriam evitado esse estrago.

O índice que mede a diferença de taxa de juros entre os títulos de 2anos e o de 10 anos, considerado o melhor indicador de uma recessão, levou um tombo de respeito, saindo de -110 pontos para -41 pontos.



Esse indicador tende a se reverter e ficar positivo assim que a recessão ocorrer, pois o mercado começará a apostar em corte de juros pelo Fed, o que vai afetar mais os títulos curtos. A ilustração a seguir mostra que em toda sequência de alta de juros ocorre algum problema no mercado, bem como uma recessão.

No post corrupção-boa-e-corrupção-ruimfiz os seguintes comentários sobre o SP500: ... “ Qual o road map? Para que a alta seja mais consistente, precisa ocorrer duas coisas: ultrapassar os níveis de 4.086/4.140 e a complementação de cinco ondas numa janela menor de uma hora. Caso contrário, uma queda abaixo de 3.922 nos coloca na defensiva” ...



Como indicado acima, estamos na defensiva e a opção de queda ganha mais tração a partir do rompimento do nível de 3.922. Em relação a um possível cenário alternativo, eu levantei pelo menos três possibilidades, sendo duas de queda e uma de alta — nada poderia ser mais incerto! A título de ilustração, veja a seguir uma das hipóteses de queda.



Nessa hipótese, um triângulo estaria em formação com a onda d) laranja. O objetivo para a queda seria 3.769/3.473 que se não for respeitado o próximo seria 3.688/3.675, sendo esta última a mais provável. Depois, uma alta deveria ocorrer para completar a onda e) e finalmente uma queda mais direcional, que levaria o SP500 ao redor de 3.300.

Que tal, fácil operar com essas hipóteses? Considere ainda que não descarto a possibilidade da alta, que se ocorrer, deverá ser a partir de agora. Quadro desafiante e propício para perder dinheiro em posições compradas ou vendidas!

O SP500 fechou a 3.920, com alta de 1,75%; o USDBRL a R$ 5,2557, com alta de 0,19%; o EURUSD a € 1,0739, sem variação; e o ouro a U$ 1.903, com queda de 0,51%.

Fique ligado!

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