O problema é sempre do estoque #S&P 500
Durante a faculdade, aprendi que a diferença entre fluxo e estoque é essencial para entender o comportamento de variáveis econômicas. Fluxo é aquilo que entra ou sai; estoque é o que se acumula. Essa distinção tão básica — e intuitiva — explica com clareza o que está por trás dos movimentos recentes nos mercados financeiros.
Imagine
um reservatório. A água que entra é o fluxo; o nível do reservatório é o
estoque. Se a entrada aumenta e a saída se mantém constante, o nível sobe. Se a
entrada seca, o nível desce. O mesmo vale para os títulos públicos. Durante
décadas, esse reservatório foi alimentado por governos endividados e
investidores em busca de segurança. Mas o jogo mudou.
A dança dos fluxos e o esvaziamento
do estoque
China e
Rússia, dois dos maiores detentores de títulos americanos, vêm se desfazendo de
suas posições. O que antes era reinvestido em Treasuries passou a ser
redirecionado para ativos reais — ouro, petróleo, prata. A metáfora do
reservatório mostra sua força: quando o fluxo muda de direção, o nível do
estoque também oscila, e com ele o preço.
Essa
mudança não é marginal. Ela está sendo amplificada por outros vetores: déficits
crônicos nos países desenvolvidos, políticas fiscais expansionistas e o retorno
da inflação, ainda que sob controle. O artigo editorial da Bloomberg crava com
precisão: o endividamento global já representa 95% do PIB mundial e caminha
para ultrapassar o pico observado na pandemia.
Em
outras palavras, os fluxos continuam fortes — só que estão evitando os
reservatórios tradicionais.
A escolha dos ativos escassos: o
“comércio da degradação”
Parte
relevante desse movimento foi apelidada pela imprensa americana de “comércio da
degradação”. Trata-se da migração de capital de moedas e títulos soberanos para
ativos escassos e “tangíveis” como ouro, prata e até criptoativos. A razão? O
medo de que os governos, incapazes de conter seus déficits, optem por
inflacionar as dívidas — ou, pior, por degradar as moedas deliberadamente.
A
leitura do Mosca é mais cautelosa. O aumento dos juros não se restringe aos
Estados Unidos; é um movimento global. E apesar da pressão sobre os bancos
centrais, a inflação não está fora de controle. Não é o colapso do dólar como
moeda de reserva, tampouco dos títulos do Tesouro americano como porto seguro.
É apenas um novo equilíbrio, um novo fluxo buscando outros reservatórios.
Mas a
desconfiança está no ar. Quando grandes gestores como Ray Dalio e Nassim Taleb
começam a sugerir que o ouro é mais seguro que o dólar, o mercado ouve.
O brilho industrial da prata
Entre
os metais, quem tem roubado a cena é a prata. O rali de 70% neste ano superou
os 55% do ouro. Há várias explicações para isso: a prata é usada não apenas
como reserva de valor, mas em aplicações industriais — de painéis solares a
carros elétricos. O estoque em Londres, principal hub do comércio global, caiu
um terço desde 2021. Já são quatro anos consecutivos de demanda acima da
produção.
O
resultado é escassez física. Fundos de investimento estão tendo dificuldade
para encontrar barras de prata. A Índia, aproveitando o festival de Diwali,
dobrou suas importações em relação ao ano anterior. Alguns compradores estão
pagando prêmios de 10% sobre o preço de referência. A liquidez evaporou. O
risco de uma crise de oferta industrial é real.
Petróleo como ativo estratégico
A mesma
lógica do estoque tem sido aplicada por Pequim no mercado de petróleo. A China
estocou mais de 150 milhões de barris neste ano — o equivalente a US$ 10
bilhões — muito acima do que consome. A explicação imediata é que o preço está
atrativo. Mas há outras motivações mais profundas.
De um
lado, a nova legislação chinesa obriga empresas públicas e privadas a manter
reservas estratégicas. De outro, existe o receio crescente de interrupções no
fornecimento, seja por tensões com os Estados Unidos, seja por riscos militares
envolvendo Taiwan. Há ainda quem veja nisso uma forma de substituir os títulos
americanos como instrumento de reserva. Comprar petróleo, segundo essa linha,
seria uma maneira de reduzir a exposição à moeda americana.
O ouro pode virar bolha?
O
perigo agora é que o movimento, inicialmente racional, se transforme em
histeria. Os bancos centrais vêm comprando ouro desde a crise da Ucrânia — e
com razão, dado o congelamento de reservas russas em moedas estrangeiras. Mas
há um limite. Os cofres não são infinitos. Se investidores e bancos centrais
entrarem no mercado ao mesmo tempo, os preços podem se descolar dos
fundamentos.
Do
ponto de vista técnico, ainda não há sinal de reversão. Mas, como aprendi ao
longo de décadas de mercado, quando o ativo vira conversa de barbearia, o topo
se aproxima. E com a prata atingindo recordes, fundos disputando barras em voos
fretados e o ouro sendo transportado como se estivéssemos nos anos 70, os
indícios estão aí. A história não rima por acaso.
A resposta está no estoque — sempre
esteve
A
conclusão, que venho repetindo há tempos, é simples: o problema é sempre do
estoque. Quando a confiança nos títulos é abalada, o fluxo muda. E o novo
equilíbrio se dá em outro reservatório. É isso que estamos testemunhando. Não é
o colapso do dólar, tampouco o fim da renda fixa. É apenas a dança do capital —
como sempre foi.
O
desafio é saber quando essa dança muda de ritmo. E principalmente, quando ela
se transforma em frenesi.
Análise Técnica
No post
“in-gold-we-trust” fiz os seguintes comentários sobre o S&P 500: “A
bolsa consinto subindo sem dar a menor chance para entrar. Agora, segundo minha
contagem, estamos próximos de completar a onda (v) vermelha e iii
laranja”
O presidente Trump acabou com a festa na última sexta-feira ao ameaçar a China com tarifas adicionais de 100%. Acho incrível como ele escolhe níveis enormes nestes momentos sem se preocupar nos impactos que pode ter. Pode ser que, como ele não pretende aumentar as tarifas partindo de pressuposto que a China vai negociar antes, esse número é mais para assustar que para valer. Eu tenho receio quando o outro lado é a China onde a lógica não é a mesma dos ocidentais.
Em todo
caso ele abrandou sua retorica no final de semana, mas a China hoje declarou
que somente uma mudança de postura dos EUA pode fazer com que eles repensem.
Ontem os mercados recuperaram e hoje deve abrir em baixa.
Do
ponto de vista técnico estamos no ponto de saber se a correção foi pequena e o
mercado vai recuperar, ou tem mais quedas a frente. Fomos estopados na posição
com uma pequena perda pois quando entrei sabia que era perigoso.
No
gráfico abaixo se a correção ficar contida e não ultrapassar 6.480 e possível
que nas próximas semanas a bolsa poderia atingir 6.984 (~5,5%) ou 7.197 (~11%).
Let The Market Speak!
O S&P 500 fechou a 6.644, com queda de 0,16%; o USDBRL a R$ 5,4730, com alta de 0,12%; o EURUSD a € 1,1602, com alta de 0,28%; e o ouro a U$ 4.144, com alta de 0,83%.
Fique
ligado!
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