O céu NÃO é o limite #IBOVESPA

 

Minha experiência com o ouro começou na década de 1980, quando, por restrições cambiais, o metal era praticamente a única forma de se proteger contra a inflação e oscilações do dólar. O mercado internacional tinha vivido um ciclo de euforia — a onça chegou a US$ 850 em 1980, depois de sair de US$ 100 em 1976 — e logo mergulhou em duas décadas de frustração.

Lembro-me de dois episódios marcantes. O primeiro foi quando comecei a trabalhar com Leo Kyrss, como seu sócio, um megainvestidor que mantinha quase todas as posições abertas de ouro na BMF. Fiquei chocado com tamanha concentração e perguntei o motivo. Ele respondeu que acreditava na alta do ouro, mas na verdade sua aposta era na valorização do dólar. Sugeri, ingenuamente, que operasse no mercado internacional — mais líquido e menos arriscado. O segundo episódio foi durante um voo entre Nova York e Los Angeles. Eu estava comprado em ouro e confiante. Ao desembarcar, ouvi no rádio que o preço havia despencado 10% em um único dia — de US$ 400 para US$ 360. Nenhuma notícia justificava a queda. Foi quando aprendi, da maneira dura, que o ouro é um ativo movido por crença, não por fundamento. 

Ontem, vimos uma repetição dessa história. O metal caiu mais de 6% em poucas horas, o pior tombo em 12 anos. Em 2025, o ouro acumulava alta de quase 60%, superando US$ 4.000 a onça — uma escalada que parecia sem fim. Muitos, mais uma vez, acreditavam ter encontrado o porto seguro absoluto. 

Mas quando um ativo sem rendimento depende exclusivamente da entrada de novos compradores, o limite é sempre o mesmo: a fé do último que chega. 

A crença e o mito do “ativo perfeito”

Joe Wiggins chamou o ouro de “o ativo de crença definitiva”. Seu valor, diz ele, é determinado apenas pelo que acreditamos que os outros acreditam. Quando o preço sobe, surgem narrativas para justificá-lo — inflação, “debasement”, incerteza política — mas a relação causal é inversa: o preço sobe primeiro, e depois se criam as histórias. Isso explica por que o ouro é terreno fértil para bolhas. 

Shuli Ren, da Bloomberg, descreveu bem a fase atual: Wall Street capitulou. Até Jamie Dimon, que sempre ridicularizou o metal, admitiu que “faz sentido ter um pouco na carteira”. O Banco of America fala em US$ 5.000 por onça se a demanda subir 14%. É o mesmo argumento usado para justificar toda mania — basta um fluxo marginal para multiplicar o preço. 

Só que esse raciocínio ignora a essência do ciclo. O ouro está caro não porque os fundamentos pioraram, mas porque as pessoas passaram a acreditar que o dinheiro perderá valor. Robin Brooks, em seu ensaio “The Global Debasement Trade”, chama isso de fuga global da credibilidade fiscal: os países ricos acumulam dívidas impagáveis, os juros longos disparam e o investidor, sem porto seguro, corre para o metal. 

Quando a euforia vira vertigem

O que parecia uma narrativa sólida — proteger-se da inflação e dos déficits — rapidamente se converteu em vertigem especulativa. O Wall Street Journal lembrou que esta é a terceira grande euforia do ouro em cinquenta anos. Em 1979-80 e 2010-11 o enredo era idêntico: medo de desvalorização do dólar e desconfiança do Fed. Em ambos os casos, o final foi o mesmo — o metal perdeu metade do valor em dois anos. 

O jornalista James Mackintosh alertou para a armadilha clássica: “desta vez é diferente”. É a frase mais cara da história dos mercados. O ouro pode ser seguro contra governos irresponsáveis, mas não é seguro contra o excesso de otimismo. 

Ben Carlson foi ainda mais direto: “O ouro não produz nada, não tem fluxo de caixa e passou 40 anos com retorno real negativo”. Desde 1980, o S&P 500 rendeu 8.200%, enquanto o ouro subiu 197%. Seu papel é ser diversificador — não salvador universal. 

A hora da irracionalidade

O episódio recente mostrou como a psicologia coletiva amplifica os movimentos. Segundo a Bloomberg, os fundos de ouro registraram saída de US$ 669 milhões em setembro, mesmo com a commodity nas máximas. Ou seja, parte do mercado percebeu que o rali estava ficando insustentável. 

A volatilidade explodiu, atingindo o maior nível desde 2020. Para Candice Bangsund, da Fiera Capital, “as altas dos grandes mineradores correram demais, rápido demais”. Já Nancy Tengler, gestora da Laffer Investments, confessou: “Sou comprada em ouro há anos, mas o que vejo agora me tira o sono”. São sinais de topo clássico. 

O céu não é o limite

O ouro é, antes de tudo, um termômetro de desconfiança. Quando o investidor acredita que o sistema vai ruir, ele compra ouro. Quando percebe que o sistema resiste, vende. Por isso, cada ciclo de euforia do metal é também um retrato do medo de uma geração. 

Eu vivi isso nos anos 1980, vi se repetir em 2011 e vejo de novo agora. A diferença é que hoje a irracionalidade ganhou velocidade digital — posts, memes e ETFs amplificam o efeito manada. O ouro deixou de ser um refúgio e virou um palco de apostas. 

A lição é simples e permanente: o céu nunca é o limite. Toda vez que um ativo começa a ser tratado como invencível, o mercado se encarrega de devolvê-lo à realidade. 

A opinião do Mosca vocês conhecem, somos favoráveis ao ouro quando a análise técnica aponta neste sentido e desfavoráveis quando aponta no sentido inverso. O compromisso é com o bolso, nada mais.


Análise Técnica

Pensei em escrever sobre o ouro, mas vou deixar para amanhã. Além do mais, em uma janela de duas horas, o ativo está prestes a completar cinco ondas — bastando negociar abaixo de US$ 4.005. Se isso ocorrer, pode surgir uma oportunidade de venda — isso mesmo, venda! — mais adiante.

No post “Ondas de dúvida” comentei o seguinte sobre o Ibovespa:  “Minha perspectiva para a bolsa brasileira é de queda nas próximas semanas. A principal razão é a formação de cinco ondas destacadas no retângulo em verde. Mas antes disso ocorrer, uma retração pode surgir, tendo os seguintes limites: 142,7 mil / 143,6 mil / 144,5 mil.”


  
A bolsa recuou até o último limite apontado acima, atingindo 145,2 mil, e logo depois ensaiou leve recuperação — o que pode ter criado um bom ponto de risco-retorno. Para se envolver em uma venda, o stop loss adequado seria 147,5 mil (+2,5%), embora fosse possível utilizar o limite de 146 mil. Essa recente recuperação tem, portanto, o aspecto de mera correção. 

— David, coragem sugere uma venda! 

Já estava pensando nisso, mas havia prometido que não sugeriria trades no Ibovespa, considerando que o software que utilizo atualmente não oferece precisão suficiente. Ainda assim, talvez valha a pena observar com atenção.

O S&P 500 fechou a 6.699, com queda de 0,53%; o USDBRL a R$ 5,3978, com alta de 0,19%; o EURUSD a € 1,1606, sem variação; e o ouro a U$ 4.101, com queda de 0,58%.

Fique ligado!

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