Juros: Todos com a mesma cara #USDBRL

 


O mercado de juros, assim como rostos em grupos étnicos pouco familiares, pode parecer monótono à primeira vista. Para o Mosca, a percepção de que os rendimentos de títulos de 3 meses a 30 anos convergem em uma faixa estreita reflete “o efeito de homogeneidade de grupo externo”, uma metáfora psicológica que ilustra como a falta de exposição a nuances leva a generalizações. No mercado financeiro, essa convergência de juros, descrita no artigo do Wall Street Journal, é um enigma: Treasuries, ações, caixa e bonds corporativos oferecem retornos similares, com o spread entre o maior e o menor rendimento sendo o menor em 40 anos. Mas, como o Mosca alerta, essa calmaria está com os dias contados, e a audácia dos investidores será testada em um cenário de inflação re acesa e incertezas tarifárias.




Essa convergência de juros, conforme James Mackintosh no WSJ, resulta de dois fatores principais: inflação e lucros corporativos. Após o pico inflacionário de 2022, os rendimentos de títulos do governo e caixa subiram para níveis pré-2008, enquanto margens de lucro elevadas e apostas em crescimento empurraram as valuations do S&P 500, reduzindo o earnings yield para 4,7%, contra 4,4% do Treasury de 10 anos.




O problema é que essa uniformidade deixa os investidores em um dilema. Não há prêmio significativo para travar capital em Treasuries de longo prazo em vez de fundos de curto prazo, nem para emprestar a grandes empresas em vez do governo. Pior, as ações, negociadas a 21 vezes os lucros projetados, exigem um crescimento de lucros de 13% ao ano, quase o dobro da média histórica, para justificar suas valuations. O Mosca alerta que, sem uma recessão, os títulos de longo prazo não oferecem atratividade, e a preferência por prazos curtos é a escolha racional nesse momento.

A ameaça das tarifas de Trump, como destacado no WSJ, é o gatilho que pode romper essa monotonia. Embora os piores temores de uma recessão global tenham diminuído, a ansiedade com a inflação persiste. Leituras iminentes de preços ao consumidor e produtor podem gerar volatilidade, já que as tarifas, implementadas em 2 de abril de 2025, devem elevar custos. O Mosca prevê que esse impacto inflacionário será temporário, desde que a difusão da inflação não ultrapasse 70%, evitando um cenário mais estrutural. No entanto, a percepção dos consumidores é preocupante: o New York Fed reporta expectativas de inflação de 3,5 % para o próximo ano, o que pode se tornar uma profecia autorrealizável, com trabalhadores exigindo salários mais altos e empresas elevando preços. Outros Institutos como o da Universidade de Michigan reportam expectativas de inflação de 6,6% para o próximo ano, a maior desde 1981




A política monetária está em xeque. O Federal Reserve, relutante em cortar juros conforme investidores esperam, enfrenta um dilema: se as empresas absorverem os custos das tarifas sem repassar aos preços, podem cortar empregos, sinalizando desaceleração econômica e justificando cortes de juros. Por outro lado, um repasse agressivo pode reacender a inflação, forçando o Fed a manter ou até elevar taxas. O Mosca reforça que, nesse cenário, títulos de curto prazo são a melhor aposta, pois o prêmio para alongar só se justificaria em uma recessão, que, embora mais provável, ainda não é o caso base.

Além disso, a convergência de yields levanta questões sobre a segurança dos Treasuries. O prêmio de risco — o rendimento extra exigido para segurar títulos de longo prazo — atingiu o maior nível desde 2014, refletindo volatilidade e temores de inflação ou até de risco fiscal, dado o déficit federal persistente. Alguns investidores, como apontado por Mackintosh, estão optando pelo “ABUSA trade” (Anywhere But U.S.A.), buscando ativos fora dos EUA, onde a convergência ainda não ocorreu. Luca Paolini, da Pictet, prevê uma “grande convergência” global, com crescimento mais rápido na Europa e Japão e desaceleração nos EUA e China, sugerindo barganhas em ações europeias e japonesas. O Mosca, contudo, mantém cautela: embora a Europa e o Japão mostrem sinais de melhora, os EUA ainda concentram o big tech, e a diversificação global exige precisão.

As implicações para os mercados são claras. O S&P 500, apesar de recuperar-se da queda pós-tarifas, está caro, com um múltiplo de 21,4 vezes os lucros futuros, acima da média de 10 anos de 18,7. Casos como o da PVH, dona da Calvin Klein, que viu suas ações despencarem 18% após revisar lucros para baixo devido às tarifas, mostram que os lucros corporativos estão vulneráveis.




Para o investidor, o momento exige sofisticação e audácia contida. Títulos de curto prazo oferecem segurança e flexibilidade, enquanto os de longo prazo só seriam atraentes em um cenário recessivo, que ainda não se materializou. Fora dos EUA, ativos europeus e japoneses podem oferecer oportunidades, mas o risco de volatilidade permanece. A metáfora do Mosca ressoa: assim como rostos se tornam distintos com familiaridade, os juros, hoje “todos com a mesma cara”, revelarão suas diferenças à medida que tarifas, inflação e políticas monetárias ré esculpirem o cenário.

Análise Técnica

No post “o-risco-invisível-da-ia” fiz os seguintes comentários sobre o dólar: “Destaquei com um retângulo laranja que pode estar se formando um triângulo e, como tal, o esperado seria um último movimento de queda. No entanto, a opção em que estou trabalhando tornou-se um pouco menos provável. O stop loss garante uma perda pequena caso o preço resolva voltar a subir”



Não contei a vocês, mas na semana passada estive a um triz de fechar a posição. Decidi, porém, manter a lógica. O dólar rompeu a área em laranja e, agora, a probabilidade de queda aumentou. Daqui em diante, surgem duas possibilidades importantes, com direções opostas:

Falta mais uma alta – Esse é o cenário em que venho apostando há tempos, desde a mínima de R$ 4,70 atingida em junho de 2023. Espero que o dólar alcance a casa dos R$ 7,00. Ressalto que sempre destaquei que o caminho seria tortuoso, numa onda 5 conhecida como ending diagonal. Nesse caso, espero uma retomada da alta após o dólar atingir cerca de R$ 5,40 (uma queda de ~3%). Enfatizo que ele não precisa necessariamente chegar a esse nível; por isso, vou ajustando o stop loss sempre que possível.



Início de uma queda extensa – Nesse cenário, que não é o meu principal, o dólar poderia despencar para R$ 3,67 (-32%), R$ 3,10 (-45%) ou até R$ 2,62 (-54%). Um verdadeiro colapso! Obviamente, isso não aconteceria da noite para o dia, assim como levou 14 anos para a moeda subir. Poderíamos esperar algo dessa magnitude em um horizonte semelhante.




– David, você enlouqueceu? Com esse governo, não há a menor chance de uma queda de 50%! Impressiona sua coragem de sugerir isso.

Concordo que, visto de hoje, parece absurdo, e o governo, longe de ajudar, atrapalha bastante. No entanto, observe que o prazo para algo assim é longo, e muita coisa pode mudar aqui e no exterior. De qualquer forma, esse não é meu cenário base, apenas um alerta. Para que isso se concretize, precisaríamos ver quedas mais expressivas no curto prazo.

O S&P 500 fechou a 6.005, sem variação; o USDBRL a R$ 5,56, sem variação; o EURUSD a € 1,1424, com alta de 0,26%; e o ouro a U$ 3.327, com alta de 0,55%.

Fique ligado!

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