A ingratidão do sucesso #nasdaq100

 

Vou comentar algumas passagens que ocorreram durante o período que estive pela Linear. Em 1994, me juntei a mais 3 sócios para fundar uma das primeiras empresas de administração de fundos de terceiros, uma startup da época sem ter o nome. Começamos com praticamente zero de capital próprio e já de início abrimos certo número de fundos internacionais bem como selamos parcerias com alguns bancos e corretoras. A ideia começou a tomar forma.

A notoriedade dos meus sócios, principalmente Ibrahim Eris que posteriormente foi presidente do BCB, acrescida de nossa credibilidade nos mercados, permitiu um crescimento substancial. Em pouco mais de 3 anos atingimos a marca de U$ 1,0 bilhão administrados, que equivaleria a um montante bem superior em valores atuais.

Em agosto de 97 saímos na capa da revista Exame com um título sugestivo: Os Homens do Risco, onde uma matéria de 8 páginas contava a breve história do nosso sucesso. Me recordo bem o dia em que foi lançado esse exemplar, porque nessa noite fui a uma apresentação no Teatro Municipal. Tive uma sensação estranha ao caminhar pelo teatro, onde várias pessoas me cumprimentavam (muitas eu talvez nem conhecesse), e ao passar percebia um certo burburinho.

Paralelamente, começamos a ser paparicados por bancos internacionais que demonstraram interesse em comprar a empresa; um já estava em fase adiantada no processo de due diligence, era ninguém menos que a Merrill Lynch, quinta maior instituição financeira americana. Foi quando começou a crise da Ásia. Tínhamos uma gama de fundos com diversos níveis de risco, um especial de nome Tiger era muito, muito arriscado: dei-lhe o apelido de “tarja preta”.

Numa terça-feira de outubro de 97, com viagem marcada para conversas sobre o processo de venda, a bolsa brasileira interrompeu ainda de manhã as negociações, com 10% de queda. Nosso problema maior não era tanto na bolsa, mas no mercado de DI, onde o contrato que tínhamos em posição, que oscilava 40 pontos, estava em queda de 4.000! Me lembro de ir ao escritório da Berrini, onde ficava o pessoal de gestão, para decidir o que fazer. Esse fundo, naquele exato momento, estava com patrimônio negativo, o que significava que os sócios teriam que aportar recursos para cobrir as margens. O Clinton salvou nossa vida a dar uma declaração durante o almoço que fez os DI’s subirem 2.000 da mínima. Zeramos as posições, mas o estrago estava feito.

Daí em diante, sofremos resgates maciços durante um tempo, levando o volume administrado para U$ 100 milhões. Quantas não foram as noites sem dormir!

Esse breve histórico de um caso real chega ao assunto de hoje. No ano passado, publiquei 2 posts contando a trajetória de uma gestora de fundos ARK, cuja principal é Cathie Wood, que virou coqueluche de Wall Street administrando uma família de fundos de alta tecnologia a-mulher-maravilhamulher-maravilha-2.0 Porém, seus retornos que eram estelares vêm dando lugar a quedas sucessivas e, consequentemente, à redução de recursos administrados, conforme relata Jonathan Levin em artigo na Bloomberg.

Ações arriscadas estão sendo atingidas, mas os leais seguidores de Cathie Wood não param de comprar na queda (Buy the Dips? Meu comentário). Os investidores de varejo continuam a acorrer o ETF ARK Innovation de Wood, que captou cerca de US$ 718 milhões líquidas no último mês. Como Eric Balchunas, da Bloomberg Intelligence, observou na quinta-feira, isso coloca o fundo negociado em bolsa entre os principais fundos dos EUA. ‎

‎Lá se vão os investidores que buscam segurança diante da guerra. A popularidade duradoura da ARK pode ser o exemplo mais forte de quanto o derretimento do Covid-19 recondicionou os investidores. Sem dúvida, os universitários que compram a ARK em seus aplicativos Robinhood viram o declínio de 62% desde fevereiro de 2021 e concluíram que o fundo deve dar um salto.‎

‎Investir nunca é tão fácil, no entanto, e é um momento incomum para ficar comprado em um portfólio extraordinariamente especulativo, dada uma guerra na Ucrânia e um choque de petróleo inédito nesta geração. A sangrenta invasão da Ucrânia pela Rússia pode continuar por meses; os preços das commodities podem subir cada vez mais; e a estagflação poderia atingir economias que não a vivenciam desde a década de 1970. O aumento do preço da gasolina causará danos suficientes à demanda dos consumidores por outras coisas, e a economia dos EUA certamente não precisa que seus jovens adultos percam todo o seu dinheiro do aluguel no mercado de ações.‎

‎Como Jessica Rabe, da DataTrek Research, observou esta semana, o desempenho do ETF de inovação da ARK desde seu pico de fevereiro de 2021 está começando a parecer estranhamente semelhante ao Índice Composto Nasdaq durante a deflação da bolha ponto-com. Claro, a venda no Nasdaq não terminou em um ano. Ao todo, o declínio atingiria cerca de 78% da máxima à mínima.

‎Em sua nota na quinta-feira, Balchunas da Bloomberg escreveu que o fundo de Wood está sendo recompensado por sua convicção. Diante de um mercado volátil, ela ficou com ações incluindo Tesla Inc., Roku Inc. e uma série de apostas especulativas apoiadas por ideias emocionantes e lucros muito menos emocionantes, se é que os houve. Como Balchunas observou, a condenação "pode ser imperativa para a sobrevivência de um ETF, permitindo que os investidores negociem em torno dele". Wood teria perdido seguidores se ela tivesse se afastado de sua marca principal e se tornado defensiva.‎

‎Para ser claro, a estratégia de Wood pode funcionar bem a longo prazo, mas ela e seus seguidores estão em um mundo de volatilidade. Agora entendo por que muitos gestores preferem fazer esse tipo de investimento no conforto do capital de risco, onde o dinheiro é comprometido para a vida de um fundo e eles não têm que lidar com o referendo diário altamente imperfeito sobre a valorização que é o mercado de ações. Mas quando os investidores de varejo estão acumulando algumas das ações mais arriscadas do planeta durante um período de caos, provavelmente é apenas mais um sinal de que algo está terrivelmente errado nesse mercado.‎

Embora o artigo deu um tom otimista à evolução do patrimônio de seus fundos, não deve deixar sua equipe segura. No gráfico a seguir, nota-se uma queda de aproximadamente 60% do pico. Essa involução é composta pelas quedas do fundo bem como pelo saque de clientes. Minha experiência diz que uma instituição financeira que passa por uma crise séria dificilmente consegue retornar a parte do que era, se é que consegue ficar em pé. Veja o exemplo do Citibank que em 2008 só não quebrou por conta da ajuda do governo, e nunca mais foi o mesmo banco. “Machuca a placa”, e segurança é tudo em uma instituição financeira.

Isso significa que Cathie Wood virou burra (eu inclusive?). Certamente não!

A fama, principalmente em instituições financeiras, deixa as pessoas mais confiantes em suas capacidades e as tornam por consequência cegas em determinados momentos. Na Linear, uma das coisas que mais me preocupava era a “convicção” nas posições, denotando um certo grau de arrogância. Não adianta falar nem avisar, o ser humano está sujeito as essas fraquezas do ego. Tenho quase certeza de que o mesmo aconteceu com a Ark.

Não é por menos que o trabalho elaborado na FEA por mim e outra colaborada, sobre os fundos multimercados brasileiros, levam a conclusões contrarias as que se prega – que são de longo prazo. A conclusão desse trabalho diz que você deveria trocar de fundos (*) a cada três meses para ganhar do CDI. Essa é a razão que não gosto dessa categoria, mais dia mesmo dia, o gestor vai falhar e a partir daí dificilmente recupera.

(*) O trabalho leva em consideração uma carteira de 7 fundos, com medições de performance de períodos em períodos.

Essa é a ingratidão que provém do sucesso! Como tudo na vida também ficamos obsoleto!

No post limite-de-perda, fiz os seguintes comentários sobre a nasdaq100: ...” A busca para a definição das bolsas através dos gráficos, principalmente em momentos como o atual, onde pode haver uma reversão (para cima ou para baixo) em função do andamento da guerra, é desafiadora. A postura que tenho adotado é de bastante flexibilidade e adaptações sempre que algum movimento indicar dessa forma. Como todos sabem, trabalho com a alta da bolsa até prova em contrário, o que não surgiu até o momento” ... ...” Eu vejo duas áreas distintas conforme apontada no gráfico:

região crítica: caso a nasdaq100 entre nessa região, a alta esperada pode ser postergada, mas não saberia dizer agora até que nível.

Região encorajadora: nesse caso a chance de alta aumenta.” ...



Pouca coisa se alterou na última semana, se algo poderia dizer ficou marginalmente pior, mas ainda dentro da região crítica sem romper para baixo. Mas qual seria o cenário caso a bolsa caia abaixo de 13.065? Nesse caso o cenário precisaria adotar algumas alterações conforme mostrado a seguir.


Ao romper o nível de 13.065, a opção acima ganha preferência. Para quem entende de EW observa a formação (rara) de uma expanded diagonal, com altas e baixas se sucedendo até atingir o ponto de reversão ao redor de 12.400/11.800.

- David, e se não parar nesses níveis que você apontou?

Bem, aí a história fica para uma outra ocasião. Posso adiantar que a queda que eu estava prevendo mais para o meio do ano estará em curso. Mas não sofra por antecipação.



O SP500 fechou a 4.204, com queda de 1,30%; o dólar a R$ 5,0745, com alta de 1,27%; o EURUSD a € 1,0909, com queda de 0,69%; e o ouro a U$ 1.985, com queda de 0,53%.

Fique ligado!

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