Profissionais amadores # ouro # gold

 

Quem é velho leitor do Mosca sabe que não recomendo o investimento em fundos de maneira geral. A verdade é que eu deveria fazer uma divisão quando falo do mercado brasileiro. Pois bem, eu o classificaria em três grandes grupos: fundos de renda fixa, fundos de ações e multimercados. Aos fundos de renda fixa tenho menos aversão, diria que sou neutro; o que se deve observar é o retorno, o gestor e as condições de resgate. Meu problema maior é com os outros dois.

Vamos começar pelos multimercados. Quando estava participando de alguns cursos de mestrado na FEA, eu e outra aluna, Marina Braga, elaboramos um trabalho acadêmico abrangendo a indústria de fundos multimercados no período de 2005 a 2015. A ideia desse trabalho era identificar se uma carteira composta dos sete melhores fundos apresentava desempenho consistente. O número de sete fundos é uma recomendação de outro trabalho acadêmico indicando ser essa a quantidade “ótima” para esse fim. A regra era a seguinte: em períodos de 3,6,9 e 12 meses era a feita a seleção e o retorno avaliado em períodos iguais de 3,6,9 e 12 meses. Ou seja, a cada x meses escolhia os melhores em retorno e se avaliava qual era a rentabilidade em todas essas janelas à frente. Isso se repetiu durante o período coletado.

As conclusões: para começar, dos 2.000 fundos somente 400 participaram da amostra, pois os outros fecharam no meio de caminho – nada a estranhar, pois de cada 100 fundos somente 20 sobrevivem mais de cinco anos. O resultado final estava transcrito numa matriz que compunha a combinação de prazos e, sem surpresa para mim, essa carteira só rendia acima do CDI em prazos muito curtos – três meses de observação e três meses de retorno, ou seja, ao invés de serem de longo prazo, como é divulgado, você só tem sucesso fazendo trocas frequentes a cada três meses, o que é praticamente impossível.

A categoria é composta por gestores, a princípio, de qualidade destacada, mas essa é uma condição necessária, porém não suficiente para que mantenham sua performance. Então não recomendo que entrem num gestor X que apresentou um retorno estupendo no passado, achando que irá ficar a vida inteira investido. O melhor é procurar algum fundo de fundos que faça a gestão para você, tirando quem deixou de performar, mantendo os melhores e buscando novos. Localmente existem fundos assim e, mesmo que esteja pagando uma taxa adicional para essa gestão, deve valer a pena se fizerem um bom trabalho.

Outro dia fiquei sabendo de um fundo internacional que aplica uma estratégia semelhante à qual cheguei na conclusão de meu trabalho, — seu nome é Milenium. Grosso modo, fazem a alocação segundo sua escolha e a partir daí uma rotação constante, tirando quem não performa e colocando novos.

Chegamos aos fundos de ações, aos quais reservo minha maior aversão. Pesquisa após pesquisa o resultado se confirma, apenas muito poucos conseguem performar acima de seu benchmark, e os que o conseguem por um ano não mantêm sua performance num período mais de longo de cinco anos. Minha percepção é que as taxas cobradas eram a maior parte da razão dessa falha, mas um artigo publicado por Joachim Klement em seu site Klement on Investing levantou outra possibilidade. Esse estudo contempla fundos de valor e crescimento. Essas categorias são bem divulgadas no mercado americano pois o universo de empresas de capital aberto permite essa segmentação, o que não é o caso no mercado brasileiro onde predominam os fundos de valor.

O efeito de disposição, ou seja, a propensão a vender ganhadores e manter os perdedores, é um viés bem humano que todo investidor precisa administrar. Mas, certamente, os gestores de fundos profissionais devem ser capazes de lidar com esse viés melhor do que os investidores comuns. Bem, depende…

Durante os estágios iniciais da minha carreira, eu era um investidor de valor e trabalhava em um ambiente cheio de pessoas que seguiam a filosofia de investimento em valor. Quando as ações estavam baratas, entrávamos na compra e dizíamos a todo mundo que venderíamos essas ações assim que estivessem supervalorizadas. É a maneira consagrada de ganhar dinheiro descrita no gráfico abaixo.

Investidores de valor tentam comprar ativos subvalorizados…

O problema na prática, porém, é menos a compra quando as ações estão subavaliadas, mas a venda quando elas estão superavaliadas. Não dá para contar quantas vezes decidimos vender as participações existentes assim que elas se tornavam um pouco mais caras do que o valor justo. E eu confesso minha culpa. Quando eu administrava dinheiro, eu era bom em vender participações em portfólio ao primeiro sinal de problemas. Isso pode ter sido bom porque eu garantia os ganhos antes de uma desaceleração do mercado mas, especialmente durante um mercado de ações em alta, também foi contraproducente porque, após um pequeno revés, os preços continuavam a subir e as avaliações se tornavam ainda mais caras.

E de acordo com um estudo de Can Yilanci, esse é um problema muito comum para gerentes de valor em todos os lugares. Ele olhou para as participações trimestrais de cerca de 400 gestores de fundos de valor dos EUA e outros 400 gestores de crescimento dos EUA. Com base nas participações do fundo, ele conseguia calcular a probabilidade de os gestores de fundos venderem uma ação com lucro versus ações com prejuízo. O gráfico abaixo mostra em barras verdes a propensão dos gestores de fundos em vender uma ação mantida com ganho (PGR) ou com perda em barras vermelhas (PLR). A diferença entre essas duas probabilidades mede o efeito de disposição do gestor do fundo.

O efeito de disposição é visível para valor, mas não para gestores de fundos de crescimento

Observe como, em média, os gestores de fundos de valor são mais propensos a vender ações mantidas com lucro do que ações mantidas em baixa, enquanto os gestores de fundos de crescimento tendem a fazer o oposto. É da própria natureza de seu estilo de investimento e filosofia de investimento que os gestores de fundos de crescimento tendem a manter os investimentos o maior tempo possível para se beneficiar do forte crescimento esperado. Enquanto isso, os gerentes de valor estão sempre preocupados em manter ativos supervalorizados e tendem a vendê-los assim que esses ativos rendem dinheiro para eles.

Perceber que esse viés existe deve ajudar os investidores de valor a pensar em técnicas para gerenciá-lo. Fiz isso introduzindo regras mecânicas para vender perdedores mais cedo do que normalmente faria, mudando assim as chances de vender perdedores versus vencedores. Outros gestores de fundos implementaram regras onde eles têm uma norma rígida e rápida para vender uma ação somente depois que ela subiu 2x ou 3x ou uma vez, de acordo com suas métricas, a ação está supervalorizada em x%, onde x% é um número bastante grande, como 50%. Dessa forma, eles se forçam a segurar os vencedores por mais tempo do que parece necessariamente confortável para eles, mas removem o efeito de disposição que lhes custa desempenho.

Ao observar esses resultados, notei que os gestores dos fundos de valor viram “torcedores”, ficando com as ações que estão afetando negativamente o fundo e vendendo talvez cedo demais o que acertou. Essa atitude já deve ter acontecido com vocês e tem a ver com o fator emocional de qualquer ser humano — perder é muito doloroso, melhor esperar para recuperar, enquanto é melhor realizar o lucro o quanto antes. Esses profissionais passam pelo mesmo dilema, de uma forma diferente que um investidor, pois a princípio são os experts desse assunto.

O que falta então para eles é uma disciplina de atuação, que seria estabelecer um stop loss antes de entrar numa posição; mas duvido que aceitem, pois, seus critérios são diferentes dos usados pela análise técnica. Como poderia vender algo que caiu, porém, em seu julgamento, vale muito mais? Vão dizer que o mercado está errado.

Agindo assim, esse viés vai originar uma performance inferior no tempo que, somada aos custos, remete seu retorno abaixo do seu benchmark. Agindo como o estudo revela, esses profissionais passam à categoria de amadores, sofrendo do mesmo viés que a grande maioria dos investidores individuais.

Em virtude dos problemas que tive com meu computador – por sinal, tive que voltar ao Windows 10, pois meus programas não funcionam na nova versão — e os vários feriados, faz um bom tempo que não comento sobre o ouro, não que tenha havido alguma oportunidade. No post errar-na-mosca, fiz os seguintes comentários: ... “Sendo assim, devemos esperar mais um pouco para entrar com um trade de compra que deve ocorrer por volta de U$ 1.588/U$ 1.543. Quero ressaltar que esse ainda é um nível embrionário, já que se encontra no início do movimento” ...

Desde a última atualização, o ouro caiu um pouco mais, de uma forma mais tortuosa, pois no início de outubro ameaçou uma recuperação que acabou cedendo durante o mês. Como podem notar no gráfico atualizado, o objetivo segundo a hipótese trabalhada é ao redor de U$ 1.500.



Para ser sincero, não tenho muita razão para me envolver em um trade no metal; além do mais, no curto prazo ainda existem mais quedas à frente. Porém, o principal motivo é que imaginei uma outra possibilidade, que deixaria o ouro por muitos anos dentro de um macro triângulo.

- Hahaha, nem sei se existirá o Mosca até lá!

Tem razão, mas vamos em frente, até o final!

Veja a seguir porque poderá ocorrer. No gráfico abaixo com janela mensal, notem que entre janeiro de 1983 e março de 2001 o ouro ficou contido num intervalo entre U$ 508 e U$ 254. Nesse período, perduraram juros bastante elevados sob a gestão de Paul Volcker no Fed. Quando o ciclo de alta do ouro se iniciou, a cotação chegou a U$ 1.920 em setembro de 2011, quando o Mosca começou a ser publicado. Desde 2021, iniciamos uma nova fase de alta dos juros que saíram de níveis muito baixos e estão se recuperando. Do ponto de vista técnico, um novo ciclo de alta está em andamento e pode durar muitos e muitos anos (o contido entre as linhas paralelas durou 30 anos). Notem que ficou dentro do “caixote” representado pelo retângulo e rompeu durante este ano.

Será que o ouro pode repetir o que ocorreu no passado? Naturalmente pode, e se isso já estiver ocorrendo o próximo gráfico apresenta sua trajetória em linhas laranja para os próximos 10 anos. Se isso ocorrer, a alta imaginada ficaria para depois dessa data.


Os leitores não me entendam mal, não estou associando esse cenário como principal nem significa que não haverá sugestões de trade, meu intuito é apenas apresentar uma possibilidade dentro das várias que uma correção pode apresentar.

O SP500 fechou a 3.665, com queda de 0,80%; o USDBRL a R$ 5,2110, com queda de 1,12%; o EURUSD a 0,9782, com alta de 0,10%; e o ouro a U$ 1.627, sem variação.

Fique ligado!

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