A realidade da incerteza #USDBRL



A economia, como ciência social que analisa a alocação de recursos escassos para satisfazer desejos ilimitados, é intrinsecamente vulnerável às oscilações do comportamento humano, muitas vezes irracional. Em um mundo onde a incerteza é a única constante, decisões políticas podem transformar otimismo em pessimismo em questão de semanas. O post de hoje captura essa volatilidade ao abordar a guinada de 180 graus nas expectativas econômicas após a eleição de Donald Trump. Inicialmente, o mercado celebrou a vitória com um entusiasmo que ignorava as promessas de tarifas protecionistas, apenas para, dois meses depois, enfrentar a "quase certeza" de uma recessão, com 60% de probabilidade apontada por analistas.




Esse cenário, agravado pela imprevisibilidade das políticas tarifárias, é detalhado no relatório Top of Mind do Goldman Sachs, que oferece uma análise profunda dos impactos econômicos globais dessas medidas. Este texto mergulha nesses materiais, destacando as visões contrastantes de três economistas renomados — Paul Krugman, Jan Hatzius e Oren Cass — sobre os efeitos das tarifas de Trump.

 

O Epicentro da Incerteza: Tarifas como Catalisadoras do Caos

As tarifas impostas pela administração Trump, descritas por Krugman como "o maior choque comercial da história", reescreveram as regras do comércio global. A tarifa média dos EUA saltou de 3% para 20%, um aumento sem precedentes que afeta um volume de comércio três vezes maior do que na era do Smoot-Hawley de 1930. Essa escala, aliada à imprevisibilidade das decisões políticas, criou um ambiente de paralisia para empresas e investidores. O relatório destaca que a incerteza, mais do que o tamanho das tarifas, é o verdadeiro veneno econômico, desencorajando investimentos de longo prazo e corroendo a confiança dos consumidores, que já registra uma das maiores quedas históricas.

Para contextualizar, o Goldman Sachs revisou suas projeções para o crescimento do PIB real dos EUA em 2025 para apenas 0,5% (Q4/Q4), com uma probabilidade de recessão de 45% nos próximos 12 meses, assumindo que as tarifas do "Dia da Libertação" não sejam totalmente implementadas. A inflação, por sua vez, deve acelerar, com o índice PCE atingindo 3,5% até o final do ano, criando um cenário de estagflação que complica a resposta do Federal Reserve. Esses números refletem a gravidade do choque, mas são as opiniões dos economistas que revelam a profundidade do debate.




1. Paul Krugman: O Profeta da Incerteza

Paul Krugman, laureado com o Nobel de Economia, adota uma postura sombria, argumentando que a incerteza gerada pelas tarifas é o principal motor de uma recessão iminente. Ele observa que, historicamente, tarifas elevadas não provocam recessões por si só, mas a imprevisibilidade das políticas de Trump — com mudanças constantes e reversões que amplificam a instabilidade — cria um ambiente onde as empresas preferem "ficar de braços cruzados" a investir. Krugman destaca que a magnitude do choque tarifário, com um aumento de 17 pontos percentuais na tarifa média, é inédita, superando até o Smoot-Hawley em impacto relativo. Ele alerta para o risco de uma crise financeira, com sinais de estresse nos mercados de títulos e uma possível perda de confiança em ativos americanos, evidenciada pela desvalorização de 9% do dólar desde a posse de Trump. Para Krugman, qualquer tentativa de reverter as tarifas agora apenas aprofundaria a incerteza, dificultando a recuperação. Sua visão aponta para um futuro incerto, onde a ausência de análogos históricos torna o prognóstico ainda mais alarmante.

2. Jan Hatzius: O Pragmático Equilibrado

Jan Hatzius, economista-chefe do Goldman Sachs, apresenta uma perspectiva mais cautelosa, mas igualmente preocupante. Ele estima que as tarifas reduzirão o crescimento dos EUA em cerca de 2 pontos percentuais, devido a três fatores principais: o efeito de aumento de impostos sobre a renda real e o consumo, a contração dos investimentos empresariais devido à incerteza e o aperto das condições financeiras. Hatzius não prevê uma recessão como cenário base, mas reconhece uma probabilidade de 45% nos próximos 12 meses, que poderia aumentar se as tarifas do "Dia da Libertação" forem implementadas integralmente. Diferentemente de Krugman, ele acredita que uma reversão nas tarifas poderia estabilizar a economia no curto prazo, embora reconheça que a incerteza persistente limitaria uma recuperação robusta. Hatzius destaca a resiliência do sistema bancário em comparação com 2008, mas alerta para vulnerabilidades nas avaliações de ativos e no apetite de investidores estrangeiros por ativos americanos. Sua visão é pragmática, apostando na capacidade do Fed de mitigar danos com cortes de juros, mas ciente de que a estagflação complica essa resposta.




3. Oren Cass: O Otimista Estrategista

Oren Cass, fundador da American Compass, diverge radicalmente, enxergando nas tarifas uma oportunidade para reestruturar o comércio global em benefício de longo prazo dos EUA. Ele argumenta que as políticas de Trump, embora abruptas e mal comunicadas, não precisam causar uma recessão. Pelo contrário, Cass acredita que elas incentivarão investimentos significativos em produção doméstica, gerando melhores resultados econômicos. Ele minimiza a incerteza, sugerindo que as empresas já têm informações suficientes para adaptar suas estratégias, focando na manufatura nos EUA. Cass reconhece custos de curto prazo, mas os considera necessários para corrigir desequilíbrios comerciais históricos. Sua visão é audaciosamente otimista, contrastando com o pessimismo de Krugman e a cautela de Hatzius, e reflete uma crença na capacidade da economia americana de se reinventar sob pressão.

 

Lições do Passado e o Preço da Proteção

O relatório Top of Mind também oferece um contraponto histórico ao analisar as experiências da América Latina com o protecionismo. Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs, destaca que décadas de políticas protecionistas em países como Brasil e Argentina resultaram em baixa produtividade, inovação limitada e ciclos econômicos voláteis. A integração em cadeias globais de valor foi prejudicada, e o Mercosur, com suas altas tarifas externas, gerou desvio de comércio em vez de competitividade. Essas lições sugerem que o protecionismo de Trump, se mal executado, pode levar os EUA a um caminho semelhante de estagnação e ineficiência.



O gráfico reforça visualmente o impacto negativo do protecionismo na integração econômica da América Latina, servindo como um alerta para os EUA.

 

O Impacto Global: China e o Jogo de Soma Negativa

As tarifas também reverberam globalmente, com a China enfrentando um impacto desproporcional. Hui Shan, economista do Goldman Sachs, estima que o aumento das tarifas americanas sobre bens chineses reduzirá o PIB real da China em 2,6 pontos percentuais, com 2,2 pontos sentidos em 2025. Apesar de medidas agressivas de estímulo fiscal e monetário, essas ações não compensarão totalmente o choque externo. A China respondeu com tarifas retaliatórias, elevando a taxa efetiva sobre bens americanos para 144%, contra 107% dos EUA sobre a China. Esse jogo de soma negativa ameaça as cadeias de suprimento globais e pode intensificar a desaceleração econômica mundial, com previsões de crescimento revisadas para baixo em quase todas as grandes economias.



O gráfico ilustra a escalada das tarifas bilaterais entre EUA e China, destacando a intensidade do conflito comercial.

As tarifas de Trump colocaram a economia global à beira de um abismo, onde a incerteza é tanto o vilão quanto o catalisador. Krugman alerta para uma recessão impulsionada pela paralisia dos investimentos, Hatzius aposta em uma resposta pragmática do Fed para evitar o pior, e Cass vê nas tarifas uma chance de renascimento econômico. Contudo, as lições da América Latina e os impactos na China sugerem que o protecionismo é um jogo perigoso, com custos que podem superar os benefícios.

Ao analisar esse material, podemos nos inclinar para um lado ou outro. Não devemos esquecer o viés ao qual estamos sujeitos — se você possui posições em bolsa, pode tender a concordar com Cass; se não, talvez com Krugman. O interessante é que um deles estará certo e, em algum momento, poderá dizer: “Eu avisei”.

Outra consideração vem das finanças comportamentais, onde o saudoso economista Daniel Kahneman, laureado com o Nobel, demonstrou que uma perda de x% tem um impacto emocional muito maior do que um ganho de mesma magnitude.

 

Análise Técnica

No post “nunca-foi-tão-util-o-excel”, fiz os seguintes comentários sobre o dólar: “Como destacado acima, abaixo da região entre R$ 5,77 / R$ 5,69, adotarei a outra opção que vinha acompanhando paralelamente, cujo gráfico está abaixo. Nessa alternativa, o dólar teria um objetivo entre R$ 5,44 / R$ 5,40.”




É um momento extremamente difícil para adotar uma estratégia. Por um lado, o dólar entrou na região mencionada, o que confere um sinal positivo ao cenário alternativo. Por outro, no cenário base, o nível de R$ 5,5143 ainda não foi violado.

 Apresento as duas possibilidades:

Na opção em andamento, a onda 4 laranja já terminou. Nesse caso, a queda atual pode chegar a R$ 5,69, como indicado acima — vale esclarecer que não é obrigatório que haja uma reversão nesse nível. Acima do stop loss de R$ 5,51 pode se encaixar nesse cenário com pequenas alterações.




Na opção alternativa, a onda 4 laranja ainda não terminou, e a queda recente deve atingir R$ 5,39 / R$ 5,38, para só então iniciar um movimento de alta com objetivo ao redor de R$ 7,00 (não visível no gráfico).



- David, como se diz na gíria, com um revólver na cabeça, qual você escolhe?

- Eu entrego minha carteira, celular etc. Hahaha...

O S&P500 fechou a 5.287, com alta de 2,51%; o USDBRL a R$ 5,7272, com queda de 1,38%; o EURUSD a € 1,1420, com queda de 0,81%; e o ouro a U$ 3.375, com queda de 1,43%.

Fique ligado!

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